Investidores mostram otimismo com potencial do multifamily no Brasil
Encontro promovido pelo GRI Club reuniu mais de 100 executivos com atuação no segmento
14 de dezembro de 2022Mercado Imobiliário
A segunda edição do GRI Residencial para Renda foi realizada no fim de novembro, em São Paulo, reunindo mais de 100 líderes de incorporadoras, fundos de investimentos, operadores e especialistas do mercado multifamily (locação residencial). A programação contou com vários painéis, abarcando os principais temas relacionados ao segmento, ainda incipiente no Brasil.
Na sessão de abertura, empresas como Brookfield, Cerberus Capital, Ivanhoe Cambridge e JFL Realty avaliaram o panorama dos investimentos em ativos residenciais como foco na renda (aluguel) no país. Apesar dos juros elevados, os executivos afirmam que estão conseguindo repassar a inflação e até mesmo obter ganhos reais. “A velocidade de locação é maior do que a esperada e a receita tem crescido”, disse um participante.
Um dos principais pontos favoráveis aos players que já entraram no mercado é a escassez de oferta de qualidade, principalmente no segmento econômico. “No multifamily, o inquilino é tratado como cliente e tem à disposição diversos serviços e amenidades, como academia, choperia, salas de jogos, praças, parques, internet, enfim, todo conforto e facilidades”.
Antes restrito a bairros nobres de São Paulo, o desenvolvimento residencial com foco em renda já se alastra para outras faixas de renda, vide a parceria entre Brookfield e MRV (por meio da Luggo). A própria JFL Realty, cujo foco sempre foi o mercado paulistano de alta renda, já começa a avaliar outras praças e bolsos.
Outro destaque do painel é que o modelo se apresenta como boa oportunidade de saída para as incorporadoras, que podem focar muito mais no desenvolvimento do ativo do que na comercialização - embora se abra mão da margem, o ponto alto é que se eliminam os riscos comerciais e boa parte dos custos inerentes, como marketing e corretagem.
Segundo os executivos, por se tratar de um produto novo no país, ainda não há parâmetros claros sobre o “prêmio” que pode ser pedido, mas dados os altos níveis de ocupação dos ativos, acredita-se que há espaço para subir esta remuneração. “O turnover é rápido e o ganho real na troca é muito maior do que em outros segmentos. É o único setor do real estate em que a gente reza para o locatário sair”, brincou um executivo.
Sobre a locação social, a visão dos investidores é que pode funcionar, desde que haja arcabouço legal, subsídio público e segurança jurídica. “É necessário também agrupar incentivos à educação e ao emprego para que o subsídio não se torne permanente àquela família. Do contrário, não sairá do lugar”.
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O evento trouxe informações sobre o mercado multifamily nos Estados Unidos, com foco na acessibilidade para os inquilinos, com as participações de Carlos Balthazar e Eduardo Fonseca, da CIX Capital, e John Salib, da Castellan Real Estate Partners, com operações exclusivamente nos EUA.
Os investimentos no país se intensificaram após a crise econômica de 2008, quando boas propriedades puderam ser adquiridas por até metade do preço. Além disso, vários estados têm seus próprios programas de estímulo à habitação de interesse social, reduzindo significativamente os impostos.
Mesmo assim, ainda hoje a demanda é bem maior do que a oferta - estima-se que faltam de 3 a 6 milhões de unidades residenciais para suprir o déficit de moradia. Nos últimos anos, a acessibilidade piorou nos Estados Unidos, e o atual governo tem procurado remover obstáculos - bem como reduzir ainda mais os impostos - para fomentar a construção de habitações.
Pelas dimensões e dificuldades semelhantes, o Brasil pode se espelhar nos programas relacionados ao Multifamily Affordable Housing (MFAH) para acelerar o desenvolvimento deste mercado no país - ainda hoje, as linhas de financiamento bancário e até o equity são pensados exclusivamente para a venda (incorporação tradicional).
Em um painel sobre a operação do modelo, o destaque foi para a importância do controle do condomínio, que tanto favorece o proprietário - permitindo a tomada de decisão mais rápida - quanto os inquilinos, já que os interesses estão mais alinhados do que em operações pulverizadas (onde há outros proprietários).
O evento também repercutiu o impacto das startups na potencialização da rentabilidade dos ativos, mostrando soluções diversas e aplicáveis em diferentes fases. Com moderação de Bruno Loreto, managing partner da Terracotta Ventures, o painel contou com as participações de Fabio Godinho (Mydoor), Gustavo Kremer (Seazone), Rafael Steinbruch (Yuca) e Rony Stefano (Audaar).
A complexidade jurídica que se tem hoje não combina com a dinamicidade do modelo de negócio multifamily, que preza justamente pela rapidez e pelo conforto da experiência, de acordo com os executivos.
A lei de locações passa uma régua comum a todos os casos, com exceções para built to suit e shopping centers. “Talvez o caminho seja excepcionar também o multifamily e permitir a livre negociação entre as partes - algo mais próximo da hospedagem”, sugeriu outro, reconhecendo, porém, que é um caminho pouco provável, já que a legislação tende a ser mais protecionista ao locatário.
Um dos principais pontos levantados no debate diz respeito à conversão de uso para exploração do multifamily em hotéis, uma prática que tem sido estimulada em alguns bairros de grandes cidades, como é o caso do Rio de Janeiro; em outras, porém, ainda existem restrições urbanísticas que precisam ser superadas.
O centro das cidades é o lugar mais óbvio, mas regiões como o Porto Maravilha, no Rio de Janeiro, chamam atenção pela infraestrutura. “O Porto Maravilha é um dos maiores exemplos de investimento público que viabiliza a entrada do setor privado. Há um problema de ocupação no local, por isso é preciso levar hospitais, universidades, bares e restaurantes, mas isso só vai acontecer se houver consumo, e a resposta é o mercado residencial”.
Ainda conforme pontuaram os executivos, o multifamily fomenta o convívio social e um contínuo cuidado com o ativo, e isso tem um efeito de melhorar todo o bairro; se o bairro melhora, há um upside futuro. “A renda é uma opção melhor do que vender no presente, ainda que no Brasil os juros comam a rentabilidade no longo prazo”.
Além dos hotéis, há boas oportunidades de retrofit em prédios corporativos classe B, na leitura dos participantes. Mas seja qual for o ativo original, atualmente “é uma conta difícil de fechar”: é preciso acertar no preço do metro quadrado que tenha aderência ao bolso do cliente e ao mesmo tempo faça sentido frente aos custos da reforma.
Já quando o assunto é o desenvolvimento greenfield, a maior dificuldade está na estruturação do funding. “A captação para FIIs em projetos greenfield pede renda garantida, já que o investidor está acostumado ao dividendo mensal. Outra dificuldade é que este mercado é novo no Brasil, logo, tem uma desconfiança maior do investidor, sobretudo pessoa física”, avaliou um executivo.
Para se ter uma ideia, nos Estados Unidos, os REITS de multifamily respondem por 15% do total, equivalente a 1,5 trilhões de dólares; aqui, os fundos imobiliários do segmento representam 0,3% do total, equivalente a 240 bilhões de reais. Já os fundos de dívida estão bastante demandados, mas costumam ter um custo de capital mais caro para o tomador do recurso.
Apesar dessa dificuldade, os executivos concordam que o setor vai crescer muito, assim como aconteceu fora do país. “Há opções e oportunidades em todas as faixas de renda, entregando um alto potencial de valorização no longo prazo, mas o funding está difícil, mesmo frente aos institucionais, dado o nível de juros e a abertura da curva novamente”.
Por Henrique Cisman
Na sessão de abertura, empresas como Brookfield, Cerberus Capital, Ivanhoe Cambridge e JFL Realty avaliaram o panorama dos investimentos em ativos residenciais como foco na renda (aluguel) no país. Apesar dos juros elevados, os executivos afirmam que estão conseguindo repassar a inflação e até mesmo obter ganhos reais. “A velocidade de locação é maior do que a esperada e a receita tem crescido”, disse um participante.
Um dos principais pontos favoráveis aos players que já entraram no mercado é a escassez de oferta de qualidade, principalmente no segmento econômico. “No multifamily, o inquilino é tratado como cliente e tem à disposição diversos serviços e amenidades, como academia, choperia, salas de jogos, praças, parques, internet, enfim, todo conforto e facilidades”.
Antes restrito a bairros nobres de São Paulo, o desenvolvimento residencial com foco em renda já se alastra para outras faixas de renda, vide a parceria entre Brookfield e MRV (por meio da Luggo). A própria JFL Realty, cujo foco sempre foi o mercado paulistano de alta renda, já começa a avaliar outras praças e bolsos.
Outro destaque do painel é que o modelo se apresenta como boa oportunidade de saída para as incorporadoras, que podem focar muito mais no desenvolvimento do ativo do que na comercialização - embora se abra mão da margem, o ponto alto é que se eliminam os riscos comerciais e boa parte dos custos inerentes, como marketing e corretagem.
Segundo os executivos, por se tratar de um produto novo no país, ainda não há parâmetros claros sobre o “prêmio” que pode ser pedido, mas dados os altos níveis de ocupação dos ativos, acredita-se que há espaço para subir esta remuneração. “O turnover é rápido e o ganho real na troca é muito maior do que em outros segmentos. É o único setor do real estate em que a gente reza para o locatário sair”, brincou um executivo.
Sobre a locação social, a visão dos investidores é que pode funcionar, desde que haja arcabouço legal, subsídio público e segurança jurídica. “É necessário também agrupar incentivos à educação e ao emprego para que o subsídio não se torne permanente àquela família. Do contrário, não sairá do lugar”.
Cadastre-se na newsletter de mercado imobiliário do GRI Club e receba 1x por semana as principais notícias do setor no Brasil
O evento trouxe informações sobre o mercado multifamily nos Estados Unidos, com foco na acessibilidade para os inquilinos, com as participações de Carlos Balthazar e Eduardo Fonseca, da CIX Capital, e John Salib, da Castellan Real Estate Partners, com operações exclusivamente nos EUA.
Os investimentos no país se intensificaram após a crise econômica de 2008, quando boas propriedades puderam ser adquiridas por até metade do preço. Além disso, vários estados têm seus próprios programas de estímulo à habitação de interesse social, reduzindo significativamente os impostos.
Mesmo assim, ainda hoje a demanda é bem maior do que a oferta - estima-se que faltam de 3 a 6 milhões de unidades residenciais para suprir o déficit de moradia. Nos últimos anos, a acessibilidade piorou nos Estados Unidos, e o atual governo tem procurado remover obstáculos - bem como reduzir ainda mais os impostos - para fomentar a construção de habitações.
Pelas dimensões e dificuldades semelhantes, o Brasil pode se espelhar nos programas relacionados ao Multifamily Affordable Housing (MFAH) para acelerar o desenvolvimento deste mercado no país - ainda hoje, as linhas de financiamento bancário e até o equity são pensados exclusivamente para a venda (incorporação tradicional).
Em um painel sobre a operação do modelo, o destaque foi para a importância do controle do condomínio, que tanto favorece o proprietário - permitindo a tomada de decisão mais rápida - quanto os inquilinos, já que os interesses estão mais alinhados do que em operações pulverizadas (onde há outros proprietários).
O evento também repercutiu o impacto das startups na potencialização da rentabilidade dos ativos, mostrando soluções diversas e aplicáveis em diferentes fases. Com moderação de Bruno Loreto, managing partner da Terracotta Ventures, o painel contou com as participações de Fabio Godinho (Mydoor), Gustavo Kremer (Seazone), Rafael Steinbruch (Yuca) e Rony Stefano (Audaar).
Desafios jurídicos
Segundo investidores, operadores e advogados, a legislação inerente ao aluguel residencial está atrasada, de modo que são necessários “malabarismos” para adequá-la à realidade. “O que falta no Brasil é flexibilidade para montar os contratos conforme a demanda”, opinou um participante.A complexidade jurídica que se tem hoje não combina com a dinamicidade do modelo de negócio multifamily, que preza justamente pela rapidez e pelo conforto da experiência, de acordo com os executivos.
A lei de locações passa uma régua comum a todos os casos, com exceções para built to suit e shopping centers. “Talvez o caminho seja excepcionar também o multifamily e permitir a livre negociação entre as partes - algo mais próximo da hospedagem”, sugeriu outro, reconhecendo, porém, que é um caminho pouco provável, já que a legislação tende a ser mais protecionista ao locatário.
Um dos principais pontos levantados no debate diz respeito à conversão de uso para exploração do multifamily em hotéis, uma prática que tem sido estimulada em alguns bairros de grandes cidades, como é o caso do Rio de Janeiro; em outras, porém, ainda existem restrições urbanísticas que precisam ser superadas.
Retrofit ou greenfield?
Apesar das restrições já mencionadas, o retrofit de edificações é uma das melhores alternativas para o investimento em multifamily, especialmente porque há muitos ativos degradados - mas super bem localizados - no Brasil. “O retrofit tem a vantagem de aproveitar características que muitas vezes não são mais permitidas hoje, como os gabaritos de altura”.O centro das cidades é o lugar mais óbvio, mas regiões como o Porto Maravilha, no Rio de Janeiro, chamam atenção pela infraestrutura. “O Porto Maravilha é um dos maiores exemplos de investimento público que viabiliza a entrada do setor privado. Há um problema de ocupação no local, por isso é preciso levar hospitais, universidades, bares e restaurantes, mas isso só vai acontecer se houver consumo, e a resposta é o mercado residencial”.
Ainda conforme pontuaram os executivos, o multifamily fomenta o convívio social e um contínuo cuidado com o ativo, e isso tem um efeito de melhorar todo o bairro; se o bairro melhora, há um upside futuro. “A renda é uma opção melhor do que vender no presente, ainda que no Brasil os juros comam a rentabilidade no longo prazo”.
Além dos hotéis, há boas oportunidades de retrofit em prédios corporativos classe B, na leitura dos participantes. Mas seja qual for o ativo original, atualmente “é uma conta difícil de fechar”: é preciso acertar no preço do metro quadrado que tenha aderência ao bolso do cliente e ao mesmo tempo faça sentido frente aos custos da reforma.
Já quando o assunto é o desenvolvimento greenfield, a maior dificuldade está na estruturação do funding. “A captação para FIIs em projetos greenfield pede renda garantida, já que o investidor está acostumado ao dividendo mensal. Outra dificuldade é que este mercado é novo no Brasil, logo, tem uma desconfiança maior do investidor, sobretudo pessoa física”, avaliou um executivo.
Para se ter uma ideia, nos Estados Unidos, os REITS de multifamily respondem por 15% do total, equivalente a 1,5 trilhões de dólares; aqui, os fundos imobiliários do segmento representam 0,3% do total, equivalente a 240 bilhões de reais. Já os fundos de dívida estão bastante demandados, mas costumam ter um custo de capital mais caro para o tomador do recurso.
Apesar dessa dificuldade, os executivos concordam que o setor vai crescer muito, assim como aconteceu fora do país. “Há opções e oportunidades em todas as faixas de renda, entregando um alto potencial de valorização no longo prazo, mas o funding está difícil, mesmo frente aos institucionais, dado o nível de juros e a abertura da curva novamente”.
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Por Henrique Cisman