Inovação regulatória acelera agenda de concessões de transportes no Brasil

George Santoro, do Ministério dos Transportes, apresenta aos membros do GRI Club os avanços do setor em reunião a portas fechadas

19 de mayo de 2025Infraestructura
Por Belén Palkovsky

Membros do GRI Club atuantes no setor de transportes reuniram-se em São Paulo com o Secretário Executivo do Ministério dos Transportes, George Santoro, que apresentou os mais recentes avanços na agenda de concessões do setor, sanou dúvidas e falou abertamente sobre os entraves atuais junto à esfera privada. 

Nos últimos anos, o ministério tem intensificado sua atuação para ampliar e modernizar a carteira de projetos dos setores rodoviário e ferroviário, apostando em inovações nos âmbitos do financiamento, da regulação e dos modelos contratuais com o objetivo de atrair mais investidores. 

Esse esforço busca consolidar um dos maiores ciclos de investimentos em infraestrutura do país, marcado por um robusto pipeline de concessões. 

Recentemente, a pasta publicou uma portaria que autoriza a recompra de debêntures incentivadas pelas concessionárias, abrindo caminho para que as empresas possam reestruturar suas dívidas ao substituir os títulos emitidos em períodos de juros elevados por novos papeis com taxas mais favoráveis. 

Paralelamente, o governo avança no destravamento de investimentos ferroviários com o lançamento iminente do Plano Nacional de Ferrovias, que prevê aportes superiores a R$100 bilhões.

Nas rodovias, a meta é realizar mais 14 leilões até o final deste ano, além de repactuar contratos existentes, ampliando a carteira para potencialmente ultrapassar os R$160 bilhões em investimentos previstos. 

As iniciativas, somadas à evolução recente nos processos regulatórios, traduz-se em maior segurança jurídica e atratividade para investidores, especialmente diante do avanço do Novo Marco Legal das PPPs e Concessões. Esta legislação, que tem por objetivo modernizar o aparato normativo, ampliar alternativas de garantias e assegurar maior transparência na alocação de riscos, contempla avanços tanto para o poder público quanto para o setor privado.

Um dos destaques nesse cenário é a redução expressiva dos prazos para elaboração e aprovação de projetos e editais. Enquanto antes eram necessários até sete anos para estruturar um projeto, hoje o processo leva, em média, três anos. 

No âmbito do Tribunal de Contas da União (TCU), o tempo para apreciação dos editais caiu de quase 500 dias para cerca de 90 a 100 dias. Essa aceleração permitiu formar um pipeline consistente para os próximos três a quatro anos, tanto em rodovias quanto em ferrovias. 

O panorama reflete uma governança mais integrada e a adoção de práticas regulatórias aprimoradas, com reuniões técnicas frequentes entre representantes do ministério, agências reguladoras e potenciais investidores, promovendo interlocução madura e maior transparência. Contudo, há preocupação em relação a consórcios vencedores de leilões que sequer participaram das reuniões preparatórias, o que gera dúvidas quanto ao comprometimento e a capacidade de execução dos mesmos. 

Em paralelo, o Ministério dos Transportes inovou ao criar um modelo de leilão para venda de ações de concessionárias dentro do processo de repactuação contratual, configurando uma operação de M&A - aquisição de participação acionária - ao invés de uma nova concessão. Este formato, inédito no país, elimina a tradicional fase de negociação bilateral final, tornando o processo completamente competitivo. O modelo exige avaliações rigorosas de passivos, multas e ações judiciais pendentes, além da apuração detalhada dos haveres e deveres das concessionárias. 

Para garantir igualdade entre os competidores, foi exigida a apresentação de cartas de finanças bancárias que asseguram condições uniformes de troca de financiamentos, especialmente junto ao BNDES. Embora apresente riscos e desafios, a iniciativa representa um avanço para reequilibrar contratos deficitários e revitalizar ativos estratégicos.

No campo negativo, o licenciamento ambiental permanece como um dos maiores entraves para a execução dos projetos de infraestrutura no Brasil. A falta de sistematização e integração entre os órgãos ambientais federais e estaduais, além da disparidade nas interpretações legais, tem atrasado obras e gerado incertezas. 

Para enfrentar essa realidade, o ministério tem promovido diálogos contínuos com órgãos ambientais e concessionárias, articulando a transferência de parte da competência para os estados e ampliando o número de servidores aptos a conceder licenças. 

“Estamos diante de um gargalo que pode comprometer o ritmo dos investimentos; é essencial organizar essa fila de aprovação e construir uma agenda conjunta de priorização para cumprir os prazos contratuais”.

Problemas como a interpretação conflitante da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e decisões divergentes do TCU e da Justiça reforçam a complexidade do tema, que requer atenção e coordenação interinstitucional para evitar retrocessos.

O setor ferroviário, por sua vez, tem ganhado protagonismo com seis novos projetos contratados, que priorizam tanto passageiros quanto cargas. Contudo, enfrenta desafios financeiros e regulatórios específicos, incluindo a necessidade de aporte público para cobrir gaps de viabilidade, desequilíbrios tarifários e rigidez tributária, especialmente em relação ao crédito acumulado sobre o diesel. 

“A ferrovia ainda é muito impactada pela carga tributária e pelo modelo tarifário desproporcional, que acaba incentivando o transporte rodoviário em detrimento do modal ferroviário, que é mais sustentável”.

Além disso, o licenciamento ambiental para ferrovias costuma ser ainda mais rigoroso e complexo do que para as rodovias. As oportunidades residem na maior integração multimodal - especialmente no acesso ferroviário a grandes portos - e na articulação de incentivos regulatórios e financeiros. 

O governo também tem buscado parcerias internacionais, como um acordo recente com grupos chineses para fomentar a entrada de operadores estrangeiros no setor ferroviário brasileiro.

No campo do financiamento, a diversificação tem sido uma marca importante. Além do papel tradicional do BNDES, o uso de debêntures incentivadas vem ganhando espaço, especialmente agora, com a possibilidade de remissão. O diálogo constante com bancos multilaterais - como IFC, BID, CAF e Banco Mundial - tem sido fundamental para criar cestas de projetos que dividem riscos e atraem investidores. 

Ainda assim, a pulverização das debêntures em fundos multimercado dificulta negociações, o que levou à adoção de medidas para recomposição dessas carteiras e maior controle dos riscos envolvidos. A aproximação entre o setor financeiro e o regulatório, com foco em dados de fluxo de pagamento e mecanismos como o free flow, promete reduzir o custo do crédito para os projetos, fomentando maior competitividade.

Entre os pontos críticos levantados na discussão estão dispositivos da nova Lei de Concessões que podem trazer riscos de litígios e insegurança jurídica, especialmente no que se refere à penalização das concessionárias por eventuais excessos no pleito de reequilíbrio econômico-financeiro e à extensão de multas a controladores indiretos. Esses dispositivos, se não aprimorados, podem afugentar grandes investidores. 

Outro desafio é a filtragem eficiente dos participantes dos leilões, garantindo que players com capacidade técnica e financeira reais tenham acesso e possam entregar os resultados esperados. Uma proposta em análise é a utilização de terceiros qualificados, como seguradoras, para avaliar a qualidade das propostas e reduzir a assimetria de informações.

Para o futuro próximo, a agenda inclui a continuidade da modernização regulatória, o avanço na agenda ambiental, o desenvolvimento do Plano Nacional de Ferrovias, além de mecanismos para premiar concessionárias que excedam suas obrigações contratuais. 

“Não adianta apenas abrir leilões; é preciso garantir que os projetos sejam sustentáveis, executados e entregues com qualidade, para que a sociedade sinta os benefícios e o investimento realmente transforme a infraestrutura do país.” - concordam os executivos.