
Seguem os debates sobre as novas debêntures de infraestrutura
Incertezas macroeconômicas, juros altos e falta de clareza regulatória retardam o teste do instrumento no mercado
5 de maio de 2025Infraestrutura
Por Belén Palkovsky
Executivos de destaque dos mais diversos setores da infraestrutura brasileira reuniram-se em São Paulo para um encontro reservado a membros do GRI Club, com foco no panorama atual das debêntures de infraestrutura e das debêntures incentivadas. Durante o debate, tanto investidores quanto emissores abordaram questões normativas e regulatórias que impactam a estruturação e emissão desses títulos, além de estratégias para mitigar os efeitos das altas taxas de juros.
As debêntures vêm se consolidando como instrumento-chave para o financiamento da infraestrutura no Brasil. Emitidas por empresas com o objetivo de captar recursos no mercado, elas ganharam impulso graças a incentivos fiscais e avanços regulatórios - em especial, com a promulgação da Lei nº 14.801/2024, que marcou uma virada ao ampliar a atratividade do instrumento, sobretudo para os emissores.
Ao contrário das debêntures incentivadas, instituídas pela Lei nº 12.431/2011 e voltadas ao investidor - com isenção do imposto de renda sobre os rendimentos -, as debêntures de infraestrutura da nova lei permitem que as empresas deduzam 30% dos juros pagos na apuração do Lucro Real e da CSLL, reduzindo, assim, o custo efetivo da dívida. O benefício, portanto, não impacta o rendimento do investidor, mas sim a carga tributária da companhia emissora.
Até 2024, as debêntures incentivadas desempenharam papel relevante no financiamento de projetos em setores como energia e transportes. Agora, o escopo foi ampliado para incluir saneamento básico, telecomunicações, mobilidade urbana e infraestrutura social (como educação e saúde), embora as portarias ministeriais que regulamentam a emissão para alguns desses setores ainda estejam pendentes.
Apesar do otimismo em torno do novo marco legal, o mercado ainda aguarda maturação. Em 2024, muitos players permaneceram em compasso de espera diante da necessidade de esclarecimentos técnicos e da regulamentação setorial por parte dos ministérios envolvidos. Além disso, considerando a complexidade e o horizonte de longo prazo dos projetos de infraestrutura, ainda não está totalmente claro como os benefícios fiscais serão aplicados na prática.
“Há dúvidas em relação ao benefício fiscal para as companhias e ao apetite real dos investidores. A verdade é que o mercado ainda não testou o instrumento como um todo”.
Ainda assim, o momento é considerado promissor. O mercado de capitais brasileiro iniciou 2025 em ritmo forte: segundo a Anbima, o volume captado no primeiro trimestre foi de R$152,3 bilhões, um crescimento de 12% em relação ao mesmo período de 2024. A renda fixa liderou as emissões, com R$142,6 bilhões, enquanto a renda variável registrou apenas uma operação, da Caixa Seguridade, no valor de R$1,2 bilhão.
Entre os instrumentos de renda fixa, as debêntures continuam na liderança, com R$103,8 bilhões emitidos em 126 operações - um aumento expressivo em relação aos R$72 bilhões do primeiro trimestre de 2024 e quase o triplo dos R$37 bilhões registrados no mesmo período de 2023. Desse total, 45% referem-se às debêntures incentivadas, ante 28% em 2024 e apenas 12% no início de 2023.
No recorte específico da infraestrutura, os dados também são históricos: em 2024, o setor captou R$177 bilhões via debêntures, superando os R$136,7 bilhões de 2023. O avanço de quase 30% consolida o papel estratégico desse instrumento no financiamento de longo prazo e sinaliza a entrada em uma nova fase, com maior participação de emissores qualificados e arcabouço regulatório mais robusto.
O perfil dos investidores também vem se transformando. Hoje, os fundos de investimento representam quase metade do estoque de debêntures voltadas a projetos de infraestrutura, com crescimento superior a 50% desde 2018. A migração da pessoa física para o investidor profissional tem contribuído para a sofisticação do mercado. Fundos de pensão, no entanto, ainda são pouco representativos nesse segmento em razão de entraves regulatórios e da concorrência com títulos públicos isentos de imposto e de menor risco.
Se antes o foco se concentrava quase exclusivamente em energia elétrica, hoje o cenário é mais diverso. Saneamento, telecomunicações e logística urbana passaram a figurar entre os principais destinos de recursos. O novo marco legal do saneamento, que tem como meta a universalização até 2033, teve papel importante nesse processo, apesar da persistência de riscos regulatórios e da necessidade de contratos bem estruturados.
Esse movimento de diversificação também reflete um amadurecimento institucional: regras mais claras, contratos mais robustos e maior confiança nas parcerias público-privadas (PPPs) permitem que o mercado de capitais assuma um papel central no financiamento de projetos de longo prazo.
A nova legislação também abre espaço para a emissão de debêntures com cláusula de variação cambial, o que pode favorecer a entrada de capital estrangeiro. No entanto, a regulamentação específica dessa modalidade ainda não foi publicada, o que limita sua aplicação no curto prazo.
Outro desafio diz respeito a projetos prioritários dos setores portuário e de telecomunicações, que enfrentam obstáculos para acesso aos incentivos fiscais por não estarem organizados sob regimes formais de concessão, permissão ou autorização - exigência trazida pela nova lei. Especialistas consideram essa limitação um entrave a ser superado por meio de ajustes legais ou normativos, ainda sem previsão definida.
Mesmo diante de um cenário favorável, persistem desafios estruturais: falta de clareza regulatória para debêntures voltadas à infraestrutura social; baixa adesão dos fundos de pensão; restrições operacionais para emissores fora dos regimes públicos formais; e incertezas macroeconômicas, como volatilidade cambial, cenário fiscal e taxas de juros elevadas.
“Hoje, o mercado de capitais tem condições de financiar projetos que, há poucos anos, seriam inimagináveis. Temos uma matriz de financiamento que nunca tivemos antes no país”, conclui um executivo, em tom otimista.
Executivos de destaque dos mais diversos setores da infraestrutura brasileira reuniram-se em São Paulo para um encontro reservado a membros do GRI Club, com foco no panorama atual das debêntures de infraestrutura e das debêntures incentivadas. Durante o debate, tanto investidores quanto emissores abordaram questões normativas e regulatórias que impactam a estruturação e emissão desses títulos, além de estratégias para mitigar os efeitos das altas taxas de juros.
As debêntures vêm se consolidando como instrumento-chave para o financiamento da infraestrutura no Brasil. Emitidas por empresas com o objetivo de captar recursos no mercado, elas ganharam impulso graças a incentivos fiscais e avanços regulatórios - em especial, com a promulgação da Lei nº 14.801/2024, que marcou uma virada ao ampliar a atratividade do instrumento, sobretudo para os emissores.
Ao contrário das debêntures incentivadas, instituídas pela Lei nº 12.431/2011 e voltadas ao investidor - com isenção do imposto de renda sobre os rendimentos -, as debêntures de infraestrutura da nova lei permitem que as empresas deduzam 30% dos juros pagos na apuração do Lucro Real e da CSLL, reduzindo, assim, o custo efetivo da dívida. O benefício, portanto, não impacta o rendimento do investidor, mas sim a carga tributária da companhia emissora.
Até 2024, as debêntures incentivadas desempenharam papel relevante no financiamento de projetos em setores como energia e transportes. Agora, o escopo foi ampliado para incluir saneamento básico, telecomunicações, mobilidade urbana e infraestrutura social (como educação e saúde), embora as portarias ministeriais que regulamentam a emissão para alguns desses setores ainda estejam pendentes.
Apesar do otimismo em torno do novo marco legal, o mercado ainda aguarda maturação. Em 2024, muitos players permaneceram em compasso de espera diante da necessidade de esclarecimentos técnicos e da regulamentação setorial por parte dos ministérios envolvidos. Além disso, considerando a complexidade e o horizonte de longo prazo dos projetos de infraestrutura, ainda não está totalmente claro como os benefícios fiscais serão aplicados na prática.
“Há dúvidas em relação ao benefício fiscal para as companhias e ao apetite real dos investidores. A verdade é que o mercado ainda não testou o instrumento como um todo”.
Ainda assim, o momento é considerado promissor. O mercado de capitais brasileiro iniciou 2025 em ritmo forte: segundo a Anbima, o volume captado no primeiro trimestre foi de R$152,3 bilhões, um crescimento de 12% em relação ao mesmo período de 2024. A renda fixa liderou as emissões, com R$142,6 bilhões, enquanto a renda variável registrou apenas uma operação, da Caixa Seguridade, no valor de R$1,2 bilhão.
Entre os instrumentos de renda fixa, as debêntures continuam na liderança, com R$103,8 bilhões emitidos em 126 operações - um aumento expressivo em relação aos R$72 bilhões do primeiro trimestre de 2024 e quase o triplo dos R$37 bilhões registrados no mesmo período de 2023. Desse total, 45% referem-se às debêntures incentivadas, ante 28% em 2024 e apenas 12% no início de 2023.
No recorte específico da infraestrutura, os dados também são históricos: em 2024, o setor captou R$177 bilhões via debêntures, superando os R$136,7 bilhões de 2023. O avanço de quase 30% consolida o papel estratégico desse instrumento no financiamento de longo prazo e sinaliza a entrada em uma nova fase, com maior participação de emissores qualificados e arcabouço regulatório mais robusto.
O perfil dos investidores também vem se transformando. Hoje, os fundos de investimento representam quase metade do estoque de debêntures voltadas a projetos de infraestrutura, com crescimento superior a 50% desde 2018. A migração da pessoa física para o investidor profissional tem contribuído para a sofisticação do mercado. Fundos de pensão, no entanto, ainda são pouco representativos nesse segmento em razão de entraves regulatórios e da concorrência com títulos públicos isentos de imposto e de menor risco.
Se antes o foco se concentrava quase exclusivamente em energia elétrica, hoje o cenário é mais diverso. Saneamento, telecomunicações e logística urbana passaram a figurar entre os principais destinos de recursos. O novo marco legal do saneamento, que tem como meta a universalização até 2033, teve papel importante nesse processo, apesar da persistência de riscos regulatórios e da necessidade de contratos bem estruturados.
Esse movimento de diversificação também reflete um amadurecimento institucional: regras mais claras, contratos mais robustos e maior confiança nas parcerias público-privadas (PPPs) permitem que o mercado de capitais assuma um papel central no financiamento de projetos de longo prazo.
A nova legislação também abre espaço para a emissão de debêntures com cláusula de variação cambial, o que pode favorecer a entrada de capital estrangeiro. No entanto, a regulamentação específica dessa modalidade ainda não foi publicada, o que limita sua aplicação no curto prazo.
Outro desafio diz respeito a projetos prioritários dos setores portuário e de telecomunicações, que enfrentam obstáculos para acesso aos incentivos fiscais por não estarem organizados sob regimes formais de concessão, permissão ou autorização - exigência trazida pela nova lei. Especialistas consideram essa limitação um entrave a ser superado por meio de ajustes legais ou normativos, ainda sem previsão definida.
Mesmo diante de um cenário favorável, persistem desafios estruturais: falta de clareza regulatória para debêntures voltadas à infraestrutura social; baixa adesão dos fundos de pensão; restrições operacionais para emissores fora dos regimes públicos formais; e incertezas macroeconômicas, como volatilidade cambial, cenário fiscal e taxas de juros elevadas.
“Hoje, o mercado de capitais tem condições de financiar projetos que, há poucos anos, seriam inimagináveis. Temos uma matriz de financiamento que nunca tivemos antes no país”, conclui um executivo, em tom otimista.