Fundos confirmam investimentos bilionários em projetos de saneamento no Brasil
Sucesso das concessões recentes e agenda do novo marco estimulam injeção de capital no setor
A maior parte das regulamentações e normas de referência que acompanham o novo marco legal do saneamento básico sequer está concluída, e mesmo assim o interesse pelos projetos já se confirma no sucesso dos leilões realizados recentemente e no volume reservado pelos fundos para a participação em novas concorrências.
No início do ano, o fundo de pensão canadense CPPIB (Canada Pension Plan Investment Board) adquiriu uma participação na brasileira Iguá Saneamento, que logo na sequência venceu o leilão pelo bloco 2 da CEDAE (Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro) - o contrato foi assinado no último dia 17.
“A gente entrou recentemente no setor e está bastante animado com as perspectivas de crescimento. Fala-se em algo na casa de R$ 30 bilhões a R$ 35 bilhões por ano para universalizar o saneamento básico até 2033, e uma boa parte disso com certeza terá que vir do mercado de capitais”, afirma o diretor da área de Infraestrutura do CPPIB, Ricardo Szlejf.
O executivo ressalta a importância da participação do BNDES e da Caixa neste processo, assim como acredita que haverá grande interesse dos bancos comerciais no financiamento de projetos, além de investimentos provenientes da geração de caixa das próprias operadoras. “Mesmo assim, tem um espaço muito grande para a emissão de debêntures e outros instrumentos”, corrobora.
Na soma do capital investido “na largada” na Iguá com outra parte comprometida com investimentos no bloco 2 da CEDAE, o CPPIB já direcionou o equivalente a R$ 2,7 bilhões para o saneamento básico no Brasil e, segundo Szlejf, o fundo de pensão está disposto a investir mais nos próximos anos: “Se as oportunidades fizerem sentido, pode haver mais uns R$ 5 bilhões”, revela ao GRI.
Outro importante fundo de pensão canadense, o Ontario Teachers’ Pension Plan (OTPP) também está otimista com a agenda do saneamento básico no Brasil. “Os recentes leilões bem-sucedidos de CEDAE, Alagoas e Cariacica, dentre outros, mostram que lacunas e deficiências legais podem ser sanadas por meio de uma estruturação robusta no nível do projeto e de seu respectivo contrato de concessão”, afirma Igor Romitelli, diretor executivo do OTPP.
O fundo aporta atualmente uma cifra equivalente a R$ 89 bilhões em projetos de infraestrutura globalmente. Segundo Romitelli, a meta é aumentar o volume para R$ 170 bilhões até 2035, considerando a cotação atual do dólar canadense, o que representará 8% do portfólio total. O Brasil está na mira, embora o fundo prefira não se manifestar sobre atividades específicas.
“Adotamos uma perspectiva global e não estabelecemos metas rígidas para regiões ou setores específicos, buscando oportunidades com a melhor relação risco-retorno possível em uma variedade de mercados desenvolvidos e emergentes”, afirma o diretor executivo do OTPP.
A Vinci Partners também quer entrar no jogo. No ano passado, participou do leilão que concedeu os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário da Região Metropolitana de Maceió (AL), em um consórcio com o Grupo Águas do Brasil. Em 2021, em novo consórcio com Águas do Brasil e BRK Ambiental, fez propostas por blocos da CEDAE.
“Foram os dois maiores movimentos que a gente fez até agora na tentativa de investir no setor. Estamos analisando uma série de outros ativos com esse intuito”, afirma o sócio e head de investimentos em infraestrutura da Vinci Partners, José Guilherme Souza. O bloco 3 da CEDAE e a Companhia de Água e Esgoto do Amapá (Caesa) são alguns dos alvos monitorados - o leilão da Caesa está previsto para ocorrer na próxima quinta-feira (2).
Importância da regionalização
Concluída dentro do prazo pela maior parte dos Estados, a divisão dos municípios em blocos regionais é vista pelo mercado como um movimento correto. “A estruturação é complexa e desafiadora, mas, se bem executada, permite o subsídio cruzado dentro de cada bloco e, ao mesmo tempo, oferece uma proposta atraente entre risco e retorno para os potenciais investidores”, diz Romitelli.
Para Szlejf, a regionalização vai na direção certa ao tentar resolver a dificuldade que é haver uma concessão específica para cada município. “Teria uma complexidade e custos muito elevados. Se a regionalização vai funcionar ou não, o tempo dirá, pois é uma novidade, mas a iniciativa é correta”, opina o diretor do CPPIB.
“É fundamental que os poderes concedentes e as entidades de estruturação de projeto elaborem uma composição adequada de municípios rentáveis e deficitários, sustentada por uma robusta matriz de alocação de risco entre o público e o privado”, acrescenta o diretor executivo do OTPP.
Para o sócio da Vinci Partners, a maioria dos blocos regionais será atrativa ao investimento privado. “Acho que a demonstração de sucesso de Alagoas e do Rio de Janeiro é um estímulo para os Estados procurarem o BNDES para poder estruturar os projetos de concessão. Acredito que nos próximos seis a doze meses vai ter bastante coisa vindo a mercado”, encerra.
Por Henrique Cisman