Moody's destaca novos investimentos em energia, saneamento e transportes
Cristiane Spercel, SVP de Infraestrutura da Moody's Investors Service, fala ao GRI Club sobre o panorama do setor no Brasil
10 de novembro de 2023Infraestrutura
Por Henrique Cisman
Historicamente, o investimento em infraestrutura no Brasil não é suficiente para desenvolver o setor de forma apropriada, o que gera gargalos sensíveis em áreas como saneamento básico, transportes e mobilidade urbana. No ano passado, os aportes em infraestrutura representaram 1,86% do PIB, incluindo público e privado.
O GRI Club Infra entrevistou com exclusividade Cristiane Spercel, vice-presidente sênior de Infraestrutura da Moody's Investors Service, e traz a seguir a avaliação da executiva para o setor no país, com destaque para o pipeline de investimentos e os principais riscos a serem considerados pelos investidores.
"Vemos uma necessidade de expandir rapidamente a matriz energética e de transportes para destravar o crescimento econômico, o que apresenta muitas oportunidades", afirma Cristiane.
A Moody's avalia que o governo federal reconhece essas necessidades ao incluir no PAC 3 (Programa de Aceleração do Crescimento) projetos que somam 280 bilhões de dólares até 2026, além de um programa bastante amplo de investimentos em governos estaduais, especialmente em mobilidade urbana e desestatizações.
No centro do otimismo com essa agenda, estão reformas e avanços importantes realizados nos últimos anos, como a autonomia do Banco Central, as reformas da Previdência e Trabalhista, a definição de metas fiscais e a Reforma Tributária, vistas como importantes para a sustentação da qualidade de crédito do Brasil.
Também pesa a favor o histórico de respeito aos contratos e um ambiente jurídico transparente, aliados a um cenário macroeconômico de recuperação pós-pandemia, ainda que com uma variação do PIB menor em relação a outros países emergentes da região. Atualmente, a Moody's projeta um crescimento de 2,3% em 2023 e de 1,5% no ano que vem.
A inflação ao consumidor deve permanecer controlada, com estimativas em um intervalo de 4,5% a 5,5% nos próximos 12 meses. "Isso deve permitir ao Banco Central manter a trajetória de redução da taxa de juros, criando um cenário mais favorável para novos investimentos e condições de rentabilidades mais atrativas em novos leilões de infraestrutura", explica Cristiane.
Nos cálculos da Moody's, o capital privado pode cobrir até 60% das necessidades de investimento no setor nos próximos anos, via concessões e parcerias público-privadas. No momento, entretanto, o investidor estrangeiro está mais cauteloso em razão do contexto global, especialmente a trajetória de juros nos Estados Unidos, o crescimento mais fraco da China e os conflitos geopolíticos.
"Vemos um baixo risco de crédito nos projetos de transmissão porque eles contam com uma receita previsível em contratos regulados de longo prazo, sem exposição de volume e com reajustes periódicos", afirma Cristiane.
Por outro lado, os grandes descontos ofertados nos leilões mais recentes em razão da alta competitividade diminuem a capacidade de endividamento dos projetos, uma vez que uma receita menor reduz a disponibilidade de caixa recorrente para o pagamento da dívida.
No período de construção, a Moody's alerta para as dificuldades com licenciamento ambiental e direitos de passagem, que podem atrasar a execução e comprometer a rentabilidade para os acionistas, considerando que são cabíveis multas regulatórias se houver atraso na conclusão das obras.
"Em novos contratos no mercado livre, trabalhamos com uma projeção conservadora para os próximos quatro anos, com preços médios bem menores do que um ano atrás, em torno de R$ 90 por megawatt-hora (MWh), o que é 46% abaixo do que a estimativa feita em 2022", revela a executiva.
Neste novo cenário, a Moody's vem ajustando os ratings de algumas empresas do setor, já que a combinação de preços mais baixos com juros ainda altos comprometem a rentabilidade dos projetos - novos e existentes -, em especial os que estão voltados para o mercado livre de energia, que têm contratos mais curtos e, por esse motivo, estão mais expostos à reprecificação.
Cristiane destaca o papel desempenhado com sucesso pelo BNDES na estruturação de projetos, a exemplo das concessões de blocos da CEDAE, no Rio de Janeiro. "Acreditamos que essa agenda deve permanecer robusta, viabilizando cerca de R$ 300 bilhões em novos investimentos até 2026".
"Privatizações de estatais, como Copasa e Sabesp, têm potencial de acelerar os investimentos no setor", complementa.
O ponto de atenção é a cobrança de outorga onerosa nos leilões, pois isso pode limitar a concorrência: primeiro porque o tempo de maturação dos projetos de saneamento é mais longo, e segundo porque as empresas privadas atuantes no setor se encontram com alavancagem elevada devido a investimentos contratados nos últimos anos. "Elas estão bastante focadas na consolidação dos ativos existentes e e na gestão de seus passivos", aponta a executiva.
Neste sentido, novos projetos tendem a requerer injeção de capital dos acionistas para balancear o endividamento.
"Isso acontece principalmente nos setores elétrico e de transportes, em função das pressões inflacionárias e uma preocupação sobre a capacidade de pagamento dos consumidores".
A executiva pondera que o principal ponto a ser considerado é a capacidade de recuperação da receita em algum momento. "No Brasil, os contratos de concessão permitem a recomposição desses custos por meio de cláusulas de equilíbrio econômico-financeiro, e temos bastante evidência de suporte dos reguladores para a compensação de perdas de capital de giro".
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Historicamente, o investimento em infraestrutura no Brasil não é suficiente para desenvolver o setor de forma apropriada, o que gera gargalos sensíveis em áreas como saneamento básico, transportes e mobilidade urbana. No ano passado, os aportes em infraestrutura representaram 1,86% do PIB, incluindo público e privado.
O GRI Club Infra entrevistou com exclusividade Cristiane Spercel, vice-presidente sênior de Infraestrutura da Moody's Investors Service, e traz a seguir a avaliação da executiva para o setor no país, com destaque para o pipeline de investimentos e os principais riscos a serem considerados pelos investidores.
"Vemos uma necessidade de expandir rapidamente a matriz energética e de transportes para destravar o crescimento econômico, o que apresenta muitas oportunidades", afirma Cristiane.
A Moody's avalia que o governo federal reconhece essas necessidades ao incluir no PAC 3 (Programa de Aceleração do Crescimento) projetos que somam 280 bilhões de dólares até 2026, além de um programa bastante amplo de investimentos em governos estaduais, especialmente em mobilidade urbana e desestatizações.
No centro do otimismo com essa agenda, estão reformas e avanços importantes realizados nos últimos anos, como a autonomia do Banco Central, as reformas da Previdência e Trabalhista, a definição de metas fiscais e a Reforma Tributária, vistas como importantes para a sustentação da qualidade de crédito do Brasil.
Também pesa a favor o histórico de respeito aos contratos e um ambiente jurídico transparente, aliados a um cenário macroeconômico de recuperação pós-pandemia, ainda que com uma variação do PIB menor em relação a outros países emergentes da região. Atualmente, a Moody's projeta um crescimento de 2,3% em 2023 e de 1,5% no ano que vem.
A inflação ao consumidor deve permanecer controlada, com estimativas em um intervalo de 4,5% a 5,5% nos próximos 12 meses. "Isso deve permitir ao Banco Central manter a trajetória de redução da taxa de juros, criando um cenário mais favorável para novos investimentos e condições de rentabilidades mais atrativas em novos leilões de infraestrutura", explica Cristiane.
Nos cálculos da Moody's, o capital privado pode cobrir até 60% das necessidades de investimento no setor nos próximos anos, via concessões e parcerias público-privadas. No momento, entretanto, o investidor estrangeiro está mais cauteloso em razão do contexto global, especialmente a trajetória de juros nos Estados Unidos, o crescimento mais fraco da China e os conflitos geopolíticos.
R$ 100 bilhões em leilões de transmissão
As expectativas são boas para novos leilões de transmissão de energia no Brasil. A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) prevê um volume de projetos que equivalem a R$ 100 bilhões em investimentos para expandir o sistema até 2031. Para a Moody's, o movimento está alinhado ao processo de transição energética ao conectar projetos renováveis de fontes intermitentes, como geração solar e eólica."Vemos um baixo risco de crédito nos projetos de transmissão porque eles contam com uma receita previsível em contratos regulados de longo prazo, sem exposição de volume e com reajustes periódicos", afirma Cristiane.
Por outro lado, os grandes descontos ofertados nos leilões mais recentes em razão da alta competitividade diminuem a capacidade de endividamento dos projetos, uma vez que uma receita menor reduz a disponibilidade de caixa recorrente para o pagamento da dívida.
No período de construção, a Moody's alerta para as dificuldades com licenciamento ambiental e direitos de passagem, que podem atrasar a execução e comprometer a rentabilidade para os acionistas, considerando que são cabíveis multas regulatórias se houver atraso na conclusão das obras.
Preços mais baixos afetam empresas de geração
No primeiro semestre, observou-se uma queda acentuada nos preços médios em novos contratos de geração de energia, tanto pela recuperação do nível dos reservatórios após a crise hídrica de 2021 quanto pela entrada de 5,1 gigawatt (GW) de nova capacidade no sistema. Como a recuperação da demanda segue lenta, há uma sobreoferta de energia, derrubando os preços."Em novos contratos no mercado livre, trabalhamos com uma projeção conservadora para os próximos quatro anos, com preços médios bem menores do que um ano atrás, em torno de R$ 90 por megawatt-hora (MWh), o que é 46% abaixo do que a estimativa feita em 2022", revela a executiva.
Neste novo cenário, a Moody's vem ajustando os ratings de algumas empresas do setor, já que a combinação de preços mais baixos com juros ainda altos comprometem a rentabilidade dos projetos - novos e existentes -, em especial os que estão voltados para o mercado livre de energia, que têm contratos mais curtos e, por esse motivo, estão mais expostos à reprecificação.
Mais R$ 300 bilhões em saneamento básico
O histórico recente de investimentos em saneamento é um ótimo exemplo de como a combinação de regras claras e incentivos adequados ajuda a destravar projetos. Desde a aprovação do novo marco legal, em 2020, há um crescimento exponencial de PPPs e concessões no setor, vistas como vitais para alcançar as metas de universalização: 99% da população atendida com fornecimento de água tratada, e 90% com esgotamento sanitário à disposição até 2033.Cristiane destaca o papel desempenhado com sucesso pelo BNDES na estruturação de projetos, a exemplo das concessões de blocos da CEDAE, no Rio de Janeiro. "Acreditamos que essa agenda deve permanecer robusta, viabilizando cerca de R$ 300 bilhões em novos investimentos até 2026".
"Privatizações de estatais, como Copasa e Sabesp, têm potencial de acelerar os investimentos no setor", complementa.
O ponto de atenção é a cobrança de outorga onerosa nos leilões, pois isso pode limitar a concorrência: primeiro porque o tempo de maturação dos projetos de saneamento é mais longo, e segundo porque as empresas privadas atuantes no setor se encontram com alavancagem elevada devido a investimentos contratados nos últimos anos. "Elas estão bastante focadas na consolidação dos ativos existentes e e na gestão de seus passivos", aponta a executiva.
Neste sentido, novos projetos tendem a requerer injeção de capital dos acionistas para balancear o endividamento.
Intervenção política
A Moody's salienta os riscos de intervenções políticas na América Latina, que têm crescido recentemente, tanto no Brasil quanto na Argentina, Colômbia, no Chile e México, países nos quais a empresa também realiza cobertura de ratings."Isso acontece principalmente nos setores elétrico e de transportes, em função das pressões inflacionárias e uma preocupação sobre a capacidade de pagamento dos consumidores".
A executiva pondera que o principal ponto a ser considerado é a capacidade de recuperação da receita em algum momento. "No Brasil, os contratos de concessão permitem a recomposição desses custos por meio de cláusulas de equilíbrio econômico-financeiro, e temos bastante evidência de suporte dos reguladores para a compensação de perdas de capital de giro".
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