Pontos de insegurança da Lei 14.801 são esclarecidos em reunião do GRI Club

Desdobramentos recentes diminuem barreiras para a emissão das novas debêntures de infraestrutura

20 de agosto de 2024Infraestrutura
Por Alberto Faro, Luiz Rosa, Tomaz Sant'Anna

A Lei 12.431, de 24 de junho de 2011 (“Lei 12.431”), instituiu a modalidade de debêntures que hoje é chamada de “debêntures incentivadas”. Essa espécie de debêntures deve ter os recursos captados destinados a projetos prioritários no setor de infraestrutura e, em contrapartida, trazia benefícios fiscais aos investidores que consistem em redução do imposto de renda incidente sobre os rendimentos pagos (no caso de pessoas físicas, o IRRF é de 0%). Essa espécie de emissão tinha por objetivo fomentar o mercado de crédito e reduzir a dependência de bancos públicos no financiamento do setor de infraestrutura, atraindo investimentos do mercado de capitais.

Mais recentemente, a Lei 14.801, de 9 de janeiro de 2024 (“Lei 14.801”), não apenas implementou atualizações e melhorias relevantes à Lei 12.431, como também instituiu um novo tipo de debênture com benefício fiscal distinto. Trata-se das novas debêntures de infraestrutura, também restritas a emissões cujos recursos sejam destinados para projetos prioritários. Sob o novo regime, as emissoras que se enquadrarem dentro dos requisitos trazidos pela 14.801 poderiam excluir, na apuração do Lucro Real e da base de cálculo do CSLL, valor equivalente a 30% da soma dos juros pagos no exercício no âmbito das debêntures de infraestrutura emitidas (em adição à dedução regular desses juros). 

Mesmo com o atrativo benefício fiscal, desde a publicação da Lei 14.801, em janeiro deste ano, ainda não houve nenhuma emissão de debêntures de infraestrutura no mercado. O receio dos participantes é parcialmente atribuível a dois principais fatores: (i) o fato de alguns ministérios ainda não terem publicado portaria regulando o tema e (ii) a incerteza jurídica quanto a aplicações práticas do benefício tributário.

No tocante ao primeiro ponto, alguns ministérios iniciaram o processo de mobilização para edição das portarias regulando os requisitos para enquadramento de projetos como prioritários: a edição da Portaria nº 689, de 17 de julho de 2024, pelo Ministério dos Transportes, representa marco positivo e exemplo par, trazendo disposições que desburocratizam o procedimento de emissão das debêntures de infraestrutura/incentivadas para além do disposto na Lei 14.801 e criando relevante exemplo para os demais ministérios. Atualmente, aguarda-se a disponibilização da versão definitiva da Portaria do Ministério de Portos e Aeroportos e a edição de portaria pelo Ministério de Minas e Energia, que sinalizou que já está trabalhando internamente em sua minuta.

Já as dúvidas sobre a aplicação do benefício tributário bifurcam-se em dois pontos principais: o primeiro quanto ao que se entende por juros, ou seja, qual parcela da remuneração aos debenturistas poderia ser efetivamente computada para fins de cálculo da exclusão adicional de 30% supramencionada; o segundo é quanto será aproveitado dessa exclusão adicional na formação de prejuízos fiscais para uso futuro.

Esses pontos de dúvida foram recentemente esclarecidos no GRI Infra Bonds, realizado no último dia 14, em São Paulo, no qual Alexandre Carneiro, Assessor Especial do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) revelou que, em consulta à Receita Federal, esta apresentou entendimento bastante coerente em ambos os pontos. 

No Ofício SEI 358/2024 (“Ofício”), emitido em resposta ao questionamento específico feito pelo Programa de Parcerias de Investimentos, a Receita Federal se manifestou no sentido de que todos os índices que remuneram o instrumento (IPCA, IGPM etc.) “subsomem-se ao conceito de juro”, contribuindo, portanto, ao abatimento tributário adicional que caracteriza as debêntures de infraestrutura, reconhecendo que é indiferente se a remuneração do instrumento se dá por índices diversos, índices exatos pré-fixados ou qualquer combinação de ambos: essa remuneração sempre terá a natureza de “juro” para fins da fruição do benefício.

Adicionalmente, o Ofício também endereça dúvida quanto à possibilidade de carregar o abatimento para períodos fiscais futuros, se não for apurado Lucro Líquido no período. Nessa hipótese, a Receita Federal entende que os 30% de juros excluídos a título de incentivo “formarão a base de cálculo negativa da CSLL e o prejuízo fiscal a ser compensado em períodos subsequentes”.

Ainda que o Ofício não constitua instrumento vinculante para o Fisco, ele representa um passo muito importante para o conforto do mercado com o uso dos novos instrumentos instituídos pela Lei 14.801, indicando alinhamento entre a interpretação apresentada pela Receita Federal, a intenção do legislador de incentivar essas emissões e a expectativa dos agentes do mercado.