Volta do Reporto tem sinal verde do governo e será incluída no PL da “BR do Mar”

Expectativa do setor é que o programa volte a valer a partir de agosto

27 de julho de 2021Infraestrutura

Os incentivos tributários previstos no Reporto devem retornar com a aprovação do projeto de lei nº 4.199/2020, que institui o Programa de Estímulo ao Transporte por Cabotagem, mais conhecido como BR do Mar. A informação foi revelada ao GRI pelo presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários, Jesualdo Silva. 

Antes, havia a expectativa de que o Reporto voltasse a valer diante da votação da medida provisória nº 1.051 no Congresso, que institui o Documento Eletrônico de Transporte, também através de emenda, porém ela foi retirada a pedido do Ministério da Economia para respeitar o acórdão nº 2198/2020, do Tribunal de Contas da União, que traz uma abordagem mais restritiva em relação à renúncia de receita prevista na Lei de Responsabilidade Fiscal.

“O TCU diz que, em função da crise da pandemia, só pode haver renúncia de arrecadação se houver criação de outra receita. Como a economia vem melhorando, a expectativa é que essa barreira caia agora, no mês de agosto, e aí foi feito um acordo envolvendo o ministro Tarcísio de Freitas (Infraestrutura) e o deputado Jerônimo Goergen para que o Reporto seja apreciado no PL da BR do Mar”, afirma Silva.

Na época em que a emenda foi inserida no projeto de lei a pedido do setor portuário, no ano passado, o programa seria prorrogado até o fim de 2021. Como a BR do Mar ainda não foi votada, entretanto, o prazo de validade deverá ser alterado. “A ABTP vem conversando com a equipe técnica do senador Nelsinho Trad, que é o relator do projeto no Senado”, diz o presidente da associação. 

Ainda segundo Silva, a ABTP já solicitou agenda com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, para mostrar a importância de pautar imediatamente a BR do Mar. A expectativa é que o projeto seja aprovado em agosto. Este também seria o cenário considerado pelos ministérios de Infraestrutura e Economia.

“O ministro Paulo Guedes já deu sinal verde para a renovação do Reporto, que é imprescindível para a retomada da economia do Brasil e representa menos de 1% dos gastos tributários da União, algo entre R$ 150 milhões e R$ 300 milhões por ano”, ratifica o presidente da ABTP. 

O sócio do escritório Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados, Marcos Perez, afirma que a volta do Reporto será facilitada se o governo “jogar a favor”, o que não ocorreu na MP nº 1.051. “O governo quer que o sistema de incentivos fiscais seja extinto. No papel, isso funciona bem porque elimina os ‘puxadinhos’, mas nossa economia ainda precisa de estímulos”, explica.

Perez destaca que o Reporto tinha validade de três anos quando foi implementado, em 2004. Desde então, foi prorrogado quatro vezes, até dezembro de 2020. “A retomada do desenvolvimento econômico não vai acontecer espontaneamente; em nenhum lugar do mundo está sendo assim. O estímulo governamental é bastante importante”, ressalta. 

O especialista entende que não há recursos para investir em todos os segmentos, porém vê os portos e as ferrovias (também contempladas pelo Reporto desde 2013) como setores estratégicos na atração de capital, geração de emprego e renda. “O setor tem que mostrar isso para o Congresso e desfazer a impressão de que o benefício fiscal vai ser eterno”, acrescenta Perez.

Baixo impacto, alto retorno

Para Mauro Viegas, presidente executivo da Concremat Engenharia, existem muitos argumentos favoráveis à aprovação da volta do Reporto. “Um dos elementos do Custo Brasil é nossa estrutura portuária, que ainda precisa passar por modernização e, para isso, a gente precisa ter acesso às melhores tecnologias, aos equipamentos mais modernos”, afirma.

Sem o Reporto, continua Viegas, o interesse do investidor pode migrar para outros setores da infraestrutura. “Projetos portuários têm investimentos muito pesados e retornos de longo prazo; ter o acesso à melhor tecnologia - desonerada dos impostos federais - significa aumentar a probabilidade de investimentos acontecerem no setor”.

O executivo também argumenta que “o ganho do país [ao retomar o Reporto] é infinitamente superior ao quanto esse delta de receita de tributos impacta a poupança pública”. Na mesma linha, o CFO da DP World Americas, Marcelo Felberg, defende que os custos do programa não têm impacto em nível nacional, ao passo que os resultados dos investimentos serão significativos.

“Mais de 95% do comércio internacional brasileiro ocorre pelo setor portuário, sendo 100% do agronegócio. Olhar o Reporto com carinho é uma questão de soberania nacional. O navio que atraca em Valença ou Roterdã é o mesmo que vem para o Brasil, e isso exige dos nossos terminais portuários o mesmo nível de produtividade, eficiência e recursos tecnológicos”, completa Jesualdo Silva. 

Novos investimentos estão travados

O presidente da ABTP ressalta que o setor portuário acumulou recordes de movimentação de cargas durante a pandemia e que os terminais estavam preparados para atender a demanda graças aos investimentos que foram realizados em razão da existência dos incentivos tributários. 

“Agora, com a ausência do Reporto, muitos investimentos estão sendo postergados e nós vamos sentir falta deles daqui a dois ou três anos. Houve uma descontinuidade: as melhorias que estariam acabando no ano que vem, não estarão. A empresa não vai mudar o plano de negócio, mas ele foi elaborado com base no Reporto”, pontua Silva.

Marcelo Felberg, CFO da DP World Americas, destaca que a aquisição de máquinas e equipamentos representa 21% dos investimentos realizados nos portos brasileiros, de modo que a extinção do Reporto acarreta um impacto significativo no setor. 

“No caso da DP World Santos, por exemplo, a adição destes impostos federais, mais o ICMS estadual, significa custo adicional superior a 50%. Se o benefício for de fato extinto, haverá elevado custo tributário sobre produtos essenciais para o desenvolvimento das atividades e comprometimento dos investimentos feitos em novos equipamentos e na modernização portuária”, alerta.

A renovação do Reporto também é fundamental para garantir investimentos na enorme quantidade de projetos portuários no PPI (Programa de Parcerias de Investimentos), acrescenta Felberg. 

Segundo Mauro Viegas, presidente executivo da Concremat, os incentivos do Reporto foram importantes para as expansões e modernizações realizadas nos portos de Santos, Rio de Janeiro e Salvador, dentre outros que tiveram a participação da empresa de engenharia. “O programa não precisa ser eterno, mas ele destrava o fluxo de investimentos”, diz.

O executivo afirma que muitos agentes estão à espera da volta do Reporto para fazer as aquisições. “Eu não tenho dúvida que o processo de aprovação de novos investimentos privados fica mais difícil porque, no final do dia, eles precisam se pagar; quando se adiciona custos, é mais complicado aprová-los”.

Embora haja outras demandas e avanços na mesa, como as privatizações em andamento no setor, alterações na reforma tributária, um ambiente de maior liberdade econômica e o aumento da segurança jurídica dos investimentos portuários, a volta do Reporto é o ponto focal no momento.

“Conversamos com um player internacional interessado em colocar um terminal no Brasil e, das preocupações dele, a primeira delas é o Reporto, se vai ser renovado”, encerra Silva.


Por Henrique Cisman