Decisão do TJSP abre precedente favorável para fundos de crédito imobiliário

Juiz da 2ª Vara Cível de Botucatu decidiu que FIDC não deve responder como réu em processo por vícios construtivos

18 de outubro de 2024Mercado Imobiliário
Por Henrique Cisman

Uma decisão proferida pela 2ª Vara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo - Comarca de Botucatu, no último dia 19, abre um precedente favorável para fundos de crédito imobiliário. O caso concreto é um processo de indenização por vícios construtivos proposto pelo Condomínio Residencial Green Life. Na ação, o requerente inclui no polo passivo, além da incorporadora, o Fundo de Liquidação Financeira - FIDC, gerido pela Jive Mauá, assim como a Modal Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários, administradora do fundo. 

Um dos argumentos utilizados pelo condomínio seria a existência de grupo econômico com a incorporadora que realizou o empreendimento - e a alegada participação na cadeia de consumo -, tese que encontraria respaldo no Código de Defesa do Consumidor. Assim, o condomínio defende que tanto a administradora quanto o FIDC seriam responsáveis solidários em relação aos alegados vícios construtivos. 

O escritório Chodraui e Tambuque Advogados teve êxito ao defender que o fundo desempenha o papel de agente financeiro, sem qualquer responsabilidade em relação a eventuais vícios construtivos do empreendimento. 

Neste sentido, o pagamento em unidades do projeto ou em recebíveis provenientes da venda dos imóveis como contrapartida da operação de crédito encontra respaldo na lei de incorporação imobiliária (Lei Federal nº 4.591/64). Em sua decisão, o juiz Fabio Fernandes Lima destaca o disposto no artigo 31-A, parágrafo 12, da referida lei:

[...] a contratação de financiamento e constituição de garantias, inclusive mediante transmissão, para o credor, da propriedade fiduciária sobre as unidades imobiliárias integrantes da incorporação, bem como a cessão, plena ou fiduciária, de direitos creditórios decorrentes da comercialização dessas unidades, não implicam a transferência para o credor de nenhuma das obrigações ou responsabilidades do cedente, do incorporador ou do construtor, permanecendo estes como únicos responsáveis pelas obrigações e pelos deveres que lhes são imputáveis.

De acordo com Rodrigo Tambuque, sócio do Chodraui e Tambuque Advogados, está claro que o fundo não tem qualquer responsabilidade relativa à construção do empreendimento, que, inclusive, já tinha o Habite-se expedido quando a operação de crédito com a incorporadora foi firmada. "Seria muito ruim para o mercado imobiliário como um todo; tanto que estamos tratando o caso como emblemático e estratégico", ressalta. 

Erich Zager, advogado à frente do processo, explica que o FIDC gerido pela Jive realizou a reestruturação da operação de crédito que a incorporadora havia tomado junto ao Banco Santander. "Na prática, isso não significa que o fundo tomou o lugar da incorporadora, mas tão-somente do agente financeiro. Logo, ele não está assumindo nenhuma obrigação de incorporação ou construção, e, portanto, não deve responder por eventual vício construtivo", reitera. 

Os especialistas também destacam o timing desta decisão: "A tese de ilegitimidade foi acatada em um momento muito importante, pois exclui do processo tanto o FIDC quanto o seu administrador antes mesmo da etapa de instrução (em que as provas sobre os vícios construtivos são produzidas), ou seja, evita o desgaste processual até que haja uma sentença de mérito, bem como os custos incorridos", explica Zager.

Segundo Tambuque, o processo poderá continuar sem a presença de Jive Mauá e Modal como réus, caso a decisão seja mantida. Ainda cabe recurso. "Há casos em que o fundo tem prazo de liquidação e, como há uma ação pendente, não consegue cumpri-lo, então é uma decisão que abre um precedente muito positivo para os fundos que financiam o mercado imobiliário", encerra.