Escritórios: juros travam novos projetos e forçam transações para reduzir dívida
No cenário externo, crise é dada como certa, mas reflexos serão menores do que em 2008
5 de maio de 2023Mercado Imobiliário
Por Henrique Cisman
Na edição anual do GRI Escritórios, principal encontro entre líderes de incorporadoras, gestoras e fundos de investimentos imobiliários, os executivos trocaram opiniões e perspectivas para o setor no Brasil e no mundo, debatendo temas como taxa de juros, oferta e demanda, financiamento, tecnologia e inovação, tendências e estratégias para navegar no cenário atual.
Dentre os participantes, nomes como André Freitas (Hedge), Augusto Martins (CSHG), Bruno Greve (HSI), Caio Castro (RBR), Camila Dias (Arcel), Carla Ponzio (Barzel), Carlos Martins (Kinea), Carlos Montenegro (São Carlos), Diego Fonseca (Jive), Fernanda Rosalem (Paladin Realty), Leandro Bousquet (Vinci), Marcelo Fedak (Pátria), Max Lima (HSI), Paulo Millen (GTIS), Roberto Perroni (Brookfield), Tiago Alves (Regus) e Walter Cardoso (CBRE).
Na Faria Lima, que se destaca por receber os melhores prédios e os maiores inquilinos, os preços negociados já se aproximam dos 300 reais por metro quadrado, estimulados por uma contínua queda na vacância, atualmente na casa de um dígito. Em outras regiões, entretanto, a correção dos valores ainda não é realidade, justamente por uma disponibilidade maior de ativos, mas também já se nota uma ocupação maior.
Fora de São Paulo, os executivos também revelam um movimento de aumento na demanda, abrindo espaço para a avaliação de novas investidas, como no Rio de Janeiro, em Brasília, Belo Horizonte, Recife e Curitiba. “Bons prédios em locais onde há oferta restrita são mais resilientes e conseguem pegar mais preço”, diz um executivo.
Após quase dois anos de retração, o mercado de lajes corporativas observa uma retomada lenta e gradual, com absorções líquidas positivas desde meados de 2021. Neste primeiro trimestre, a demanda foi especialmente elevada para ativos de até 2 mil metros quadrados.
Já faz alguns meses que às terças, quartas e quintas-feiras os escritórios atingem quase 100% de ocupação, dizem proprietários e inquilinos. “Se o Brasil voltar a crescer, haverá poucos espaços de escritórios. A vacância cairá rapidamente se isso acontecer. Bairros residenciais e cidades secundárias com certeza vão receber boa parte dessa demanda”, avalia um executivo.
A favor dos escritórios também pesa a tendência de mais área por colaborador, com alguns casos em que o espaço saiu de 10 para 27 metros quadrados, incluindo novas amenidades e serviços, como bares, restaurantes, auditórios, áreas de descanso e até creches e espaços pet. “O escritório virou um ambiente de convivência, muito além de um ambiente de trabalho, apenas”.
Para a maioria dos líderes, crises corrigem exageros, e no caso específico a leitura é que a flexibilidade significa “nem tudo para o empregado, nem tudo para a empresa” - a motivação vem de vários fatores e o home office é um deles, mas não o único nem o mais importante.
Neste contexto, não faz sentido comprar e menos ainda desenvolver novos prédios, então a vontade e os estímulos para investir no momento são baixos. “Para colocar equity agora, o prêmio tem que ser muito grande, e o risco ainda é alto, por isso o mercado está meio travado. Só há negociação se a empresa está alavancada e precisa vender”.
Mesmo assim, o sentimento geral é de otimismo olhando para o longo prazo: “Estamos há 7 anos em crise, seja por eventos nacionais ou internacionais, mas não há dúvida que vamos superar. Sobrevivemos a crises piores, com inflação de 45% quando foi instituído o Plano Real, ou na crise da bolha da internet, na qual também havia super oferta e os preços caíram; depois o mundo quebrou em 2008, depois tivemos Dilma 2 e uma economia em frangalhos, e então a pandemia”.
Na indústria de FIIs, os gestores lamentam a impossibilidade - por motivos culturais - de realizar novas emissões em razão do valor de mercado estar abaixo do valor patrimonial, uma prática que é frequente nos Estados Unidos e permite aos fundos aproveitar as boas oportunidades que aparecem, ou mesmo reduzir a alavancagem sem a necessidade de se desfazer de bons ativos a preços descontados.
“A equação é simples: a compra ocorre em um cap rate de 4%, os juros sobem, o tomador não consegue pagar, entrega o prédio. Isso é comum nos Estados Unidos, faz parte do jogo. Vai haver uma reciclagem enorme neste sentido, tem um paredão enorme de refinanciamento nos Estados Unidos e na Europa”, avalia um executivo.
Se a crise está dada, também é fato que o mercado financeiro está mais organizado do que em 2008, e o episódio atual deve ser concentrado em prédios corporativos, com repercussões menores, portanto, em relação há 15 anos.
“Acho importante mencionar que temos ativos [corporativos] no mundo todo, e mesmo em Nova York há prédios performando bem. Ativos de maior qualidade continuam atrativos e resilientes, subindo preço enquanto outros sofrem com vacância. Não é o fim do escritório; é o fim do mau escritório”, aponta outro líder do mercado.
No momento, as premissas são bastante conservadoras, e qualquer investimento deve ter um colchão para aguentar solavancos nos próximos 24-36 meses. “O curto prazo é bem preocupante, o Brasil vai muito mal politicamente, são retrocessos enormes”. Finalmente, as empresas optam primordialmente por se proteger no momento, em lugar de obter elevados rendimentos.
“Se piorar, onde vai piorar menos?”
Na edição anual do GRI Escritórios, principal encontro entre líderes de incorporadoras, gestoras e fundos de investimentos imobiliários, os executivos trocaram opiniões e perspectivas para o setor no Brasil e no mundo, debatendo temas como taxa de juros, oferta e demanda, financiamento, tecnologia e inovação, tendências e estratégias para navegar no cenário atual.
Dentre os participantes, nomes como André Freitas (Hedge), Augusto Martins (CSHG), Bruno Greve (HSI), Caio Castro (RBR), Camila Dias (Arcel), Carla Ponzio (Barzel), Carlos Martins (Kinea), Carlos Montenegro (São Carlos), Diego Fonseca (Jive), Fernanda Rosalem (Paladin Realty), Leandro Bousquet (Vinci), Marcelo Fedak (Pátria), Max Lima (HSI), Paulo Millen (GTIS), Roberto Perroni (Brookfield), Tiago Alves (Regus) e Walter Cardoso (CBRE).
Sessão de abertura do GRI Escritórios 2023. Foto: Camila França/GRI Club
Retomada é lenta, mas gradual
Historicamente, o Brasil leva mais tempo para sentir as tendências globais, mas desta vez o país está à frente na recuperação do mercado de lajes corporativas, bem como no controle da inflação. Proprietários de escritórios afirmam que o desempenho na primeira parte do ano superou as expectativas, com mais visitas e contratos assinados do que era previsto no final de 2022.Na Faria Lima, que se destaca por receber os melhores prédios e os maiores inquilinos, os preços negociados já se aproximam dos 300 reais por metro quadrado, estimulados por uma contínua queda na vacância, atualmente na casa de um dígito. Em outras regiões, entretanto, a correção dos valores ainda não é realidade, justamente por uma disponibilidade maior de ativos, mas também já se nota uma ocupação maior.
Fora de São Paulo, os executivos também revelam um movimento de aumento na demanda, abrindo espaço para a avaliação de novas investidas, como no Rio de Janeiro, em Brasília, Belo Horizonte, Recife e Curitiba. “Bons prédios em locais onde há oferta restrita são mais resilientes e conseguem pegar mais preço”, diz um executivo.
Após quase dois anos de retração, o mercado de lajes corporativas observa uma retomada lenta e gradual, com absorções líquidas positivas desde meados de 2021. Neste primeiro trimestre, a demanda foi especialmente elevada para ativos de até 2 mil metros quadrados.
Jornada flexível: a nova ordem entre prós e contras
É consenso no mercado que a jornada de trabalho flexível veio para ficar, enquanto o trabalho inteiramente remoto deve perder força. Os principais indicadores neste sentido, segundo os executivos, são a ausência do pleno emprego - ao contrário do que é visto nos Estados Unidos, por exemplo -, a má qualidade da infraestrutura para efetuar home office, o maior respeito à hierarquia e as incertezas trabalhistas.Tiago Alves (à direita) destaca evolução da jornada flexível. (Foto: Camila França/GRI Club)
Já faz alguns meses que às terças, quartas e quintas-feiras os escritórios atingem quase 100% de ocupação, dizem proprietários e inquilinos. “Se o Brasil voltar a crescer, haverá poucos espaços de escritórios. A vacância cairá rapidamente se isso acontecer. Bairros residenciais e cidades secundárias com certeza vão receber boa parte dessa demanda”, avalia um executivo.
A favor dos escritórios também pesa a tendência de mais área por colaborador, com alguns casos em que o espaço saiu de 10 para 27 metros quadrados, incluindo novas amenidades e serviços, como bares, restaurantes, auditórios, áreas de descanso e até creches e espaços pet. “O escritório virou um ambiente de convivência, muito além de um ambiente de trabalho, apenas”.
Para a maioria dos líderes, crises corrigem exageros, e no caso específico a leitura é que a flexibilidade significa “nem tudo para o empregado, nem tudo para a empresa” - a motivação vem de vários fatores e o home office é um deles, mas não o único nem o mais importante.
Alta dos juros trava novos projetos
O momento é complexo em razão do alto patamar das taxas de juros, e de acordo com os executivos, não há sinais de uma queda acentuada no curto e médio prazo. “A expectativa é que os juros continuem em dois dígitos nos próximos anos”, diz o CEO de uma gestora.Neste contexto, não faz sentido comprar e menos ainda desenvolver novos prédios, então a vontade e os estímulos para investir no momento são baixos. “Para colocar equity agora, o prêmio tem que ser muito grande, e o risco ainda é alto, por isso o mercado está meio travado. Só há negociação se a empresa está alavancada e precisa vender”.
Investidores avaliam cenário para novos investimentos e transações de escritórios. (Foto: Camila França/GRI Club)
Mesmo assim, o sentimento geral é de otimismo olhando para o longo prazo: “Estamos há 7 anos em crise, seja por eventos nacionais ou internacionais, mas não há dúvida que vamos superar. Sobrevivemos a crises piores, com inflação de 45% quando foi instituído o Plano Real, ou na crise da bolha da internet, na qual também havia super oferta e os preços caíram; depois o mundo quebrou em 2008, depois tivemos Dilma 2 e uma economia em frangalhos, e então a pandemia”.
Maior custo da dívida força negociações
Apesar da dificuldade imposta pelo alto patamar da taxa básica de juros, há muitas oportunidades disponíveis, já que uma quantidade expressiva de property companies e fundos imobiliários se encontra alavancada - e como consequência do encarecimento da dívida, precisam vender ativos a preços descontados. “Existe a possibilidade de comprar ‘joias da coroa’ em condições muito favoráveis, talvez nunca vistas, considerando o custo de reposição, por exemplo”.Na indústria de FIIs, os gestores lamentam a impossibilidade - por motivos culturais - de realizar novas emissões em razão do valor de mercado estar abaixo do valor patrimonial, uma prática que é frequente nos Estados Unidos e permite aos fundos aproveitar as boas oportunidades que aparecem, ou mesmo reduzir a alavancagem sem a necessidade de se desfazer de bons ativos a preços descontados.
Crise imobiliária internacional é certa, mas restrita
Há uma crescente preocupação externada por gestores e economistas globais em relação a um possível calote de property companies focadas em lajes corporativas, em um cenário de menor receita e aumento do custo da dívida. Para os executivos brasileiros, esta crise iminente em grandes cidades do mundo é certa e impossível de ser evitada.“A equação é simples: a compra ocorre em um cap rate de 4%, os juros sobem, o tomador não consegue pagar, entrega o prédio. Isso é comum nos Estados Unidos, faz parte do jogo. Vai haver uma reciclagem enorme neste sentido, tem um paredão enorme de refinanciamento nos Estados Unidos e na Europa”, avalia um executivo.
Se a crise está dada, também é fato que o mercado financeiro está mais organizado do que em 2008, e o episódio atual deve ser concentrado em prédios corporativos, com repercussões menores, portanto, em relação há 15 anos.
“Acho importante mencionar que temos ativos [corporativos] no mundo todo, e mesmo em Nova York há prédios performando bem. Ativos de maior qualidade continuam atrativos e resilientes, subindo preço enquanto outros sofrem com vacância. Não é o fim do escritório; é o fim do mau escritório”, aponta outro líder do mercado.
Mais de 150 executivos participaram do GRI Escritórios 2023. Foto: Camila França/GRI Club
O que é levado em conta na tomada de decisão
Em linhas gerais, as condições macroeconômicas - especialmente os níveis de inflação e juros - são pontos-chave para a tomada de decisão. Segundo um executivo, “primeiro é olhar para o país, depois olhar para o setor; se não houver crença no macro, é difícil investir ou o prêmio pedido será muito alto”.No momento, as premissas são bastante conservadoras, e qualquer investimento deve ter um colchão para aguentar solavancos nos próximos 24-36 meses. “O curto prazo é bem preocupante, o Brasil vai muito mal politicamente, são retrocessos enormes”. Finalmente, as empresas optam primordialmente por se proteger no momento, em lugar de obter elevados rendimentos.
“Se piorar, onde vai piorar menos?”