Fedak explica saída da Blackstone e criação da Blue Macaw

Nova empresa terá liberdade para fazer transações de menor tíquete. Mas a gigante perdeu apetite pela América Latina?

7 de março de 2019Mercado Imobiliário
Blue Macaw. Essa é a nova identidade corporativa de Marcelo Fedak, que desde 2015 era a 'cara' e o comandante da área imobiliária da Blackstone na América Latina. A nova companhia nasceu de um spin-off realizado no início de fevereiro, com o propósito de abrir caminho para transações cujos tíquetes ficam aquém do esperado pela gigante dos investimentos e que são justamente a faixa onde se concentram, com mais frequência, as oportunidades nos mercados latino-americanos.

Nesta entrevista de fôlego, o agora fundador e managing director da Blue Macaw explica os detalhes por trás da decisão de separar as operações, garante que o apetite da Blackstone pela região permanece e que estão previstas joint-ventures entre as duas companhias sempre que operações atrativas de maior porte forem identificadas, revela como será a captação do primeiro fundo do novo negócio e quais são as prioridades de investimento, e ainda faz um balanço da sua trajetória de executivo jovem, com passagens por instituições de peso, e que neste momento se torna um empreendedor. 

Acompanhe a conversa com Fedak, que também é membro do board do GRI Club Real Estate Brazil e participa de grande parte dos encontros do clube no Brasil e na América Latina:

 
Quando e como começou a gestação da Blue Macaw?
Fui para a Blackstone no começo de 2015. O grupo já tinha alguns investimentos aqui [no Brasil e na América Latina] e a ideia do time da sede, em Nova York, era montar o escritório local [em São Paulo] e tentar expandir a atuação na região, investindo bastante do capital do fundo principal, o Brep [Blackstone Real Estate Partners] – que é global, mas acaba sendo um fundo de Américas porque há outro fundo de Europa e um de Ásia. Na época, esse fundo [Brep] era de US$ 13 bilhões. Depois que ele terminou, veio outro de cerca de US$ 16 bilhões e agora existe um de US$ 20 bilhões. Desde o princípio, tentávamos olhar sempre o maior tamanho de transação possível; porém, a expectativa de tíquete foi subindo [acompanhando a expansão do fundo] e, paralelamente, o mercado aqui foi piorando e o câmbio, se desvalorizando. Então, ficou cada vez mais difícil achar transações que tivessem um porte que as justificasse. No final, acabamos investindo aproximadamente US$ 350 milhões nesse período.

A avaliação foi de que os investimentos concretizados ficaram aquém do esperado?
O que aconteceu foi que, no meio do percurso, as oportunidades das quais eu gostava e que achava que faziam sentido e tinham menos competição representavam um tíquete abaixo do desejado. No geral, ficavam entre US$ 30 milhões e US$ 70 milhões. Eu as levava [ao comitê da Blackstone] e debatia, e ouvia que o ativo ou a companhia era interessante, os retornos eram bons, mas o tíquete era pequeno. Por definição, esse fundo [Brep] é feito para transações maiores, e sempre surgia essa incompatibilidade diante de um mercado muito incipiente. Em determinado momento, até tentamos desenhar soluções de convergência para não ficar limitados a uma transação por ano – por exemplo, a possibilidade de comprar uma empresa e, por dentro dela, fazer as transações [menores], o que no fim das contas não se concretizou. Então, entendemos que o caminho seria separar a pasta da América Latina para ter a liberdade de fazer um fundo menor, market appropriate, em harmonia com o tamanho de oportunidades do mercado local.

O que considera um tamanho razoável para esse fundo, que agora será levantado pela nova companhia?
Um fundo de US$ 250 milhões a US$ 500 milhões, o que permite cheques de US$ 20 milhões – ou eventualmente até menores – e maiores, de, por exemplo,  US$ 50 milhões, faixa em que existe menos competição dos grandes fundos, e tudo isso mantendo a possibilidade de fazer os deals superiores, dado que o relacionamento [com a Blackstone] continua. Parte do combinado que temos, agora com a Blue Macaw, é que, toda vez que aparecer uma transação a partir de determinado tamanho, conversarei com o pessoal da Blackstone. Portanto, eles continuam com acesso ao pipeline e com a oportunidade de fazer investimentos no Brasil e na América Latina; por outro lado, nós passamos a ter a autonomia de realizar transações menores. Adicionalmente, vamos seguir fazendo a gestão dos US$ 350 milhões que foram investidos pela Blackstone até o desinvestimento.


Você, portanto, deixa de ter vínculo formal com a Blackstone e passa a atuar exclusivamente via Blue Macaw, uma companhia independente?
Sim. Hoje, a Blue Macaw é o veículo e está levantando um fundo para poder fazer esses investimentos e, em caso de uma oportunidade maior, faremos uma joint venture no ativo em questão entre Blue Macaw e Blackstone. Basicamente, com o spin-off, ficamos com o escritório e o time que atuava na Blackstone. No final, estávamos com uma equipe pequena e agora estamos até contratando mais gente.

No ano passado, em almoço oferecido durante a GRI Real Estate Week New York a membros do GRI Club por Nadeem Meghji, senior managing director e head de Real Estate da Blackstone para as Américas, na sede da companhia em Manhattan, ele mencionou que via aquele momento como mais favorável para investir na América Latina do que três anos antes e afirmou que estava muito animado. Toda essa mudança de estratégia concretizada com o spin-off significa que a apreciação mudou?
É importante elucidar esse ponto. Não se trata necessariamente de uma mudança de apetite. O ponto central é efetivamente o tíquete. Se existissem transações aqui, com frequência, com o tamanho de cheque buscado, tenho certeza de que haveria vontade de fazer. Essa dificuldade relativa ao tamanho das transações não acontece exclusivamente com a Blackstone, mas igualmente com vários outros fundos que vieram ou estão pensando em vir para cá e gerem centenas de bilhões de dólares. Todos se perguntam como fazer para ter transações maiores. Então, o ponto é que o mercado aqui precisa evoluir. O mercado de alternativos lá fora cresceu muito, ao passo que aqui ficamos estagnados.

Como será a captação do fundo da Blue Macaw: local ou internacional?
Um misto dos dois. Começamos a falar com o investidor e já notamos interesse no mercado local, desde pessoas [físicas] e seus family offices e, eventualmente, algumas instituições que fazem distribuição dentro das estruturas de private banking. Em paralelo, estou conversando com investidores lá fora, mas a impressão é de que não estão ainda 100% prontos ou tão otimistas com o Brasil como os brasileiros – e isso até natural, visto que o brasileiro está vivendo aqui o dia a dia e já percebe uma melhora na comparação com os últimos anos.

Então, tende a estrear captando localmente e depois abrir o leque?
Entendo que essa é a sequência natural.

Qual será o formato desse fundo?
Não vamos fazer fundo imobiliário, e sim um FIP [Fundo de Investimento em Participações], um drawdown fund. Não vai ser negociado na Bolsa. É um fundo como o da Blackstone lá fora, em que se chama o capital dos investidores e depois se vai investindo. Esse é um negócio que ainda tem uma representatividade muito pequena no Brasil, ao qual a maior parte dos investidores ainda não está exposta, e que achamos que vai crescer bastante.

O que será prioridade de investimento num primeiro momento em termos de classes de ativos?
Um pouco de tudo dentro de shoppings, escritórios, galpões logísticos e hotéis. O que provavelmente vamos tentar evitar – e isso é algo que a própria Blackstone evita – é fazer desenvolvimento.

Essencialmente aquisição, portanto...
Sim, e buscando aproveitar o fato de que agora a alavancagem começa a ajudar nos retornos. Na época em que fizemos aquisições com taxa de juros de 14% [ao ano], nem valia a pena colocar dívida porque o benefício da alavancagem era muito pequeno. Hoje em dia, com a taxa de juros onde está, isso mudou. É o tipo de transação que se faz lá fora nos fundos oportunistas e que podemos replicar, só que com um tíquete menor.

A Blue Macaw vai olhar para América Latina como um todo?
Sim. Na concepção original [da Blackstone], lá atrás, em 2015, a ideia era mirar Brasil, México, Colômbia, Peru, Argentina, América Central… ou seja, tudo. Chegamos a analisar Costa Rica e Panamá. No entanto, vimos que não havia transação com tamanho suficiente na maior parte da região e decidimos focar apenas Brasil e México. Tínhamos um pipeline grande de projetos até interessantes nesses outros mercados e agora, nesse novo desenho [via Blue Macaw], vai dar para também voltar a eles, pois cabem na conta.

Apenas capitais?
Exceto pelo Brasil, é difícil fugir das capitais, com exceção talvez para Colômbia e México. No Brasil, a localização vai depender da classe de ativos. Para escritórios, provavelmente vamos ficar bastante focados em São Paulo – e Rio, de maneira oportunista. Para varejo e hotéis, dá para olhar para capitais estaduais, mas não cidades secundárias e terciárias. No caso de logística, alguns mercados fora de São Paulo e Rio podem ser interessantes, por exemplo o de Minas, que é razoavelmente desenvolvido. 

Vê espaço para ir além de ativos tradicionais de real estate
Lá atrás, estudamos hospital, self-storage e senior housing, entre outros segmentos; porém, não cabiam por conta do cheque. Agora, podemos começar a olhar para esse tipo de possibilidade, mas tendo a preferir coisas que tenham já algum histórico de performance.


Por que o nome Blue Macaw, arara azul em português?
Buscávamos um nome que fizesse referência a Brasil e América do Sul, que tivesse boa sonoridade e fosse fácil de falar, razoavelmente curto e, claro, com domínio '.com.br' disponível. O processo de escolha foi demorado, mas me lembrei do que Stephen Schwarzman [chairman, CEO e cofundador da Blackstone] uma vez disse quando perguntado sobre a origem do nome Blackstone: 'não se prenda tanto ao nome porque, se você tiver sucesso, todo mundo vai lembrar e, caso contrário, esquecer; então, não vai fazer diferença'.

Você é um profissional jovem, mas que acumula passagens por instituições de peso (BTG, Goldman Sachs, Credit Suisse). Qual a sensação de encarar um voo solo neste momento?
Quando trabalhei no BTG – e cheguei antes da compra do Pactual –, tudo o que fazíamos era chamado de investimento proprietário e na época nem tinha estrutura de fundo. Todos faziam um pouco de tudo e eu, como já possuía afinidade com real estate, propus me dedicar a isso. Então, foi algo razoavelmente empreendedor dentro de uma instituição, pois se tratava de uma área que praticamente não existia. Foi isso que a Blackstone, quando começou a conversar comigo, disse que buscava: alguém que tivesse iniciado um negócio com muito pouco e que pudesse replicar a experiência dentro do sistema do grupo. Ao chegar à Blackstone, tive que abrir escritório, contratar o time etc. Então, ambas as experiências foram empreendedoras. Agora, porém, é a primeira vez que tenho esse tipo de vivência em voo solo. O bacana é que dá para misturar várias coisas que fui vendo em minha trajetória para montar um negócio que seja duradouro e fazer tudo de uma maneira bem diligente e institucional. 

Que boas práticas acumuladas você está 'importando' para a Blue Macaw?
Do BTG, trouxe o sistema de partnership e de hierarquia mais horizontal, o que dá aos profissionais a liberdade de agir e, conforme o desempenho, ganhar mais responsabilidades, podendo se tornar sócios. Da Blackstone, vieram vários processos e o modo como as transações são olhadas em detalhe, por todos os ângulos, com eficiência e agilidade – o jeito de fazer memorandos das transações, por exemplo, que permite saber onde estão todas as informações apenas ao 'bater o olho', possibilitando ter uma ideia exata do que é cada transação, seus potenciais riscos e se estamos diante de um bom negócio. Esse é o tipo de coisa que já fazemos e vamos nos manter adotando. Também vamos continuar gerindo o portfólio seguindo os mesmos padrões [que seguíamos na Blackstone]. Vamos ainda procurar preservar o lema  buy-fix-sell, que rege o negócio de real estate da Blackstone. Acho que tudo isso será um diferencial. 

Observando sua trajetória até aqui, o que apontaria como seu maior erro e seu maior acerto?
O maior acerto, provavelmente, foi há dez anos, na época do BTG, quando decidi me dedicar a real estate, um negócio em que não se investia muito – e que ainda é uma indústria nascente. Já quanto ao maior erro, penso que subestimei um pouco a relevância de estar perto do headquarters para o processo de investimento e sua evolução. Na minha experiência na Blackstone, vi a diferença de estar num escritório que não é a sede. No dia a dia, há menos interações espontâneas e perde-se fluidez. Chegamos a discutir a possibilidade de eu atuar em Nova York, mas, se por um lado, seria positivo para discutir com as pessoas que estão no comitê, por outro, não me encontrar no lugar onde os investimentos são feitos tornaria difícil ter o primeiro acesso às oportunidades.

Você tem uma rotina de trabalho intensa e quatro filhos pequenos. Qual o segredo para conciliar vida pessoal e profissional?
Algo positivo é morar perto do escritório e ter a escola dos meus filhos no caminho. Então, todo dia tomamos café da manhã juntos e os levo para a escola. Essa proximidade também permite que eu participe de alguma atividade na escola, quando ocorre. À noite, no entanto, muitas vezes quando chego eles já estão dormindo, mas nos finais de semana passamos tempo juntos. Neste começo da Blue Macaw, com muito a fazer, as coisas estão um tanto desbalanceadas, com menos tempo para o lado pessoal; porém, isso é natural numa fase como esta. De todo modo, outra lição importante que trago da Blackstone é que, uma vez que haja processos bem organizados, cria-se eficiência e tudo demora menos tempo. Isso para mim é muito importante. Nunca acreditei que uma pessoa tem que ficar trabalhando até mais tarde simplesmente porque sim – isso se justifica apenas se efetivamente há motivo. Se dá pra fazer de casa, faz-se de casa. Então, busco ter um bom equilíbrio, até porque hoje em dia está comprovado que é preciso tempo [livre] para poder ser criativo, para virem soluções à cabeça. É necessário sair um pouco dos problemas e aí a solução aparece. 


Entrevista concedida à editora-chefe Giovanna Carnio


GRI Latin America 2019



As perspectivas de investimento imobiliário e tendências que vão nortear os rumos do setor na América Latina nos próximos meses são foco do Latin America GRI 2019. O grande encontro vai reunir os maiores nomes dos diversos segmentos de real estate que atuam na região em Nova York nos dias 27 e 28 de março. Marcelo Fedak é um dos confirmados. Conheça a programação completa