Fundo residencial da Vectis com imóveis da Cyrela capta R$ 197 milhões
Reunião virtual do GRI apresentou detalhes da operação, administrada pelo Charlie
O interesse do mercado imobiliário pelo modelo de renda residencial ganhou novo capítulo nas últimas semanas, quando a Vectis Gestão lançou o fundo imobiliário VCRR11 (Vectis Renda Residencial), cujo portfólio inicial é composto por unidades de quatro empreendimentos da Cyrela Brazil Realty: Atmosfera Vila Mariana, Cyrela For You, Cyrela On The Parc By Yoo e Iconyc - este último adquirido integralmente.
Os detalhes e as características do fundo e da operação futura das unidades foram debatidos em uma reunião virtual organizada pelo GRI no último dia 30, que contou com as presenças de Alexandre Aoude, CEO da Vectis, Laercio Boaventura, diretor de Investimentos da Vectis, Efraim Horn, co-presidente da Cyrela, e Allan Sztokfisz, CEO do Charlie, que moderou o painel.
Boaventura afirmou que o IPO - oferta 400 da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) - captou R$ 197 milhões com uma classe única de cotas negociada exclusivamente para a base do Itaú, distribuidor do fundo. Nos primeiros 36 meses, prazo estimado para conclusão das obras, os investidores terão renda garantida de 8% ao ano, período após o qual a rentabilidade dependerá das taxas de ocupação dos apartamentos.
Segundo Aoude, a Vectis identificou na Cyrela a parceira ideal para colocar o VCRR11 em pé. Uma vez definidos o tipo de produto e as localizações - dois prédios estão na Vila Mariana e outros dois na Vila Clementino -, o Charlie foi escolhido para operar os empreendimentos quando estiverem prontos.
“Do ponto de vista de gestão, ter o controle do condomínio inteiro ou do sub-condomínio - sem depender de assembleias - é fundamental para manter a operação redonda. Isso faz bastante diferença neste tipo de produto”, disse Sztokfisz. A estratégia explica a opção por projetos que ainda estão em desenvolvimento, complementou Boaventura.
Mas o que explica a Cyrela vender seus imóveis para o fundo, se poderia lucrar mais com a venda direta no varejo? Conforme indicado por Boaventura, a Vectis adquiriu os apartamentos com um desconto médio de 15% em relação aos preços de tabela. O co-presidente da Cyrela, Efraim Horn, pontuou que a arrecadação poderia ser até 70% maior na venda direta para os compradores.
A resposta, contudo, tem vários ângulos, segundo Horn: “O primeiro é que a Cyrela é uma empresa que busca um propósito. A gente se esforça para encantar os clientes, portanto, não queremos só vender e partir para a próxima. Não somos experts em operar unidades não residenciais e não queremos entregar um produto que simplesmente seja vendido, mas que a gente não garanta a qualidade do serviço que o investidor pode fornecer para o cliente”.
Neste sentido, o executivo também faz coro à importância de que haja um único dono e operador: “A gente quer transformar a localização em um patrimônio que vai ser cuidado como deve para que o inquilino sempre tenha um ativo cinco estrelas, tal como entregue pela Cyrela, mas isso não explica por que topamos vender”.
De acordo com Horn, a capacitação de corretores para a venda de unidades não residenciais levaria tempo e tiraria o foco do core business da empresa, que é a venda residencial. “É mais conveniente a gente focar em nosso negócio, abrir mão de parte da rentabilidade e acelerar o negócio. Além disso, a gente tem uma parcela nesse fundo, então a gente espera também ganhar na valorização”.
Tese foi bem aceita?
O diretor de Investimentos da Vectis afirma que levou um susto nas primeiras rodadas de apresentação do fundo, dada a grande quantidade de perguntas e solicitações de reuniões dos investidores para entender o produto. “A gente achou que seria mais simples explicar a tese, já que investir em imóveis está no DNA do brasileiro”, contou Boaventura.
“Quando se faz um produto diferente em relação ao que as bases de distribuição estão acostumadas, isso requer um tempo maior, o roadshow passa a ser muito mais importante para explicar ao investidor. Ele está acostumado a tijolo ou a renda, aí criamos um produto que tem uma renda garantida durante três anos e depois um upside de acordo com a comercialização. O investidor ficou meio perdido, mas uma vez que o mercado entenda, o negócio decola”, complementou Aoude.
Segundo Sztokfisz, o foco da operação é o short stay, que está “no meio do caminho” entre a hotelaria e a moradia. “Isso faz com que a gente consiga entregar um retorno superior em relação ao modelo tradicional, o que é um dos diferenciais. A operação é complexa, e até então não havia nenhum fundo voltado para isso. Tivemos que explicar essa particularidade”.
Boaventura ainda acrescentou que foram escolhidas diferentes tipologias de apartamentos - de um e dois dormitórios - para haver maior flexibilidade. “A plataforma do Charlie permite que faça a migração de short stay para mid stay. Essa flexibilização, combinada com a boa localização dos ativos, oferece proteção ao produto que a gente desenhou”.
“O perfil do cliente residencial é muito mais amplo do que meramente hoteleiro, que é de dois ou três dias. Tem uma demanda maior, é mais resiliente que a hotelaria tradicional. No meio do roadshow, a gente já tinha números para mostrar que o negócio se manteve com certa estabilidade [durante a pandemia]”, ratificou o CEO do Charlie.
Perfil do investidor
Embora inicialmente houvesse a expectativa de que investidores institucionais entrassem no fundo, o perfil predominante no IPO foi do investidor do varejo. “A pessoa física, antes, comprava um apartamento com R$ 350 mil, que hoje não custa menos que R$ 600 mil. O pequeno investidor não consegue mais manter o apartamento na região e na qualidade que deseja. O fundo imobiliário abre essa oportunidade para ele”, explicou Boaventura.
A leitura da Vectis é que, em um primeiro momento, os investidores maiores querem ver a tese se comprovar dentro de um fundo com essa operação. A expectativa é que haja adesão conforme haja mais liquidez e visibilidade do VCRR11.
Alta dos juros é prejudicial?
Para o CEO da Vectis, Alexandre Aoude, a resposta é não. “Quando pegamos a curva futura dos juros, hoje, a renda garantida [do VCRR11] já é superior. Com o upside, isso fica ainda melhor. Acho que não vamos ter taxas de juros tão altas quanto no passado, então o produto está corretamente precificado quando se considera a curva de juros futura”.
Ainda segundo Aoude, não há mais espaço para “sentar no dinheiro” esperando por rentabilidades de 14% com o CDI. “Se usar a mesma premissa dos juros subindo, os preços dos imóveis deveriam estar caindo, e não é isso que estamos vendo”, compara.
Outro aspecto, segundo Boaventura, é a valorização imobiliária das unidades, que não está na conta. “São regiões nas quais, entre a gente assinar a compra do imóvel com a Cyrela e o IPO ocorrer, teve valorização de 30% a 40%. O preço estava congelado porque já havíamos negociado. Só essa diferença já deveria trazer para o fundo, em valor patrimonial, uma valorização”.
De acordo com o co-presidente da Cyrela, os terrenos já subiram em torno de 20%, o custo de construção de fato (não o INCC) subiu cerca de 30% nos últimos 20 meses. “Se o INCC subiu pouco mais que 20%, o custo real aumentou, então o valor de reposição do que o fundo já tem hoje são algumas dezenas a mais, talvez 30%”.
“A Cyrela sempre focou no produto de morador, mas temos muitos investidores que compram nosso produto também, surpreendentemente, até mesmo apartamentos de luxo. A gente acredita que, independentemente da subida de juros, o reconhecimento por parte de muitos investidores imobiliários vai continuar igual ao que foi nos últimos anos”, encerrou Efraim Horn.
Por Henrique Cisman