Gestoras miram escritórios boutique em momento desafiador
Risco é maior para novos projetos e aquisições esbarram na dificuldade de captação
Monousuário ou não, o conceito boutique - que não é nem um pouco novo - parece ganhar protagonismo neste início de período pós-pandemia. Gestoras focadas no mercado corporativo - seja para desenvolver ou adquirir - ressaltam a busca por ativos com essa característica.
“Todos os nossos prédios trazem o conceito boutique, com a flexibilidade necessária para receber empresas da área da saúde, por exemplo, que é uma demanda que tem crescido bastante”, afirma Guilherme Bueno Netto, sócio e membro do conselho da RBR Asset, além de responsável por gerir o fundo RBR Desenvolvimento Comercial, que tem sete projetos na carteira.
Três empreendimentos já estão em obras: JMA Corporate Boutique, JHA Corporate Boutique e PVN Corporate Boutique - impossível não notar a semelhança nos nomes. Os edifícios estão situados na Faria Lima/Pinheiros, no Itaim Bibi e na Faria Lima, respectivamente, ponto alto do portfólio.
Também de olho no conceito, mas mais focada em aquisições, a VBI Real Estate tem no Union Faria Lima um dos principais representantes desse perfil de ativo. “A gente sempre procura projetos de qualidade em localizações diferenciadas, afinal, o prédio precisa ser especial para ser boutique, e foi por isso que a gente comprou o Union”, diz Rodrigo Abbud, sócio fundador da VBI e gestor do fundo VBI Prime Properties.
A incorporadora Noah é outra que está focada nos projetos boutique, conta o fundador e CEO da empresa, Nicolaos Theodorakis: “É o produto do futuro no mercado imobiliário comercial, até pela característica de originação dos terrenos, naturalmente cada vez menores por conta da escassez”.
No momento, a empresa está iniciando a obra de uma loja com 600 metros quadrados e já tem no pipeline um built to suit de 2500 metros quadrados, ambos em São Paulo. “Temos conversas avançadas para projetos maiores, que vão de 3,5 mil a 14 mil metros quadrados. Há uma mescla, mas nosso portfólio tem mais boutique, que são lajes menores”, afirma o executivo.
Nem tudo são flores nos escritórios
Os projetos do fundo RBR Desenvolvimento Comercial foram todos aprovados antes da pandemia de covid-19. Segundo Netto, se fosse hoje, cerca de 40% teriam outra finalidade. “A margem de valor ficou pequena. Se você tem um terreno no Itaim, por exemplo, hoje vale mais a pena desenvolver um residencial, que está muito valorizado nesses bairros, têm mais liquidez e potencialmente uma obra um pouco mais barata”.
A ressalva está na localização: endereços como Faria Lima e arredores - onde a vacância é bem menor que a média da cidade - ainda comportam novos projetos pontualmente. “O desafio é achar um terreno que possibilite ‘fechar a conta’ com o elevado custo de obra e de Cepac (Certificado de Potencial Adicional de Construção)”, crava Netto.
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No portfólio do fundo, é provável que metade dos projetos ainda não iniciados sofra modificações para estarem mais aderentes ao cenário atual, segundo o gestor. “Acertamos na localização, então acreditamos na resiliência dos empreendimentos, e assim a gente continua acreditando nesse mercado, mas bem mais preocupados do que antes”.
O timing pode ser um aliado. O CEO da Noah destaca que, por conta da pandemia, há uma hiato na produção de novos edifícios; com a esperada redução da vacância ao passo que as empresas retomam com mais força o trabalho presencial, pode haver uma suboferta nos próximos dois anos, acredita Theodorakis.
A primeira entrega do RBR Desenvolvimento Comercial está prevista para janeiro de 2023, e as obras ainda não iniciadas somente devem terminar em 2024. “Essas regiões já estão com uma oferta super baixa de bons prédios novos, mas sabemos que vai depender da recuperação econômica, dos rumos da política… é um cenário incerto”, diz Netto.
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Para o VBI Prime Properties (PVBI), como em todo contexto de turbulência, haverá boas oportunidades na mesa, porém as captações devem ser mais difíceis. “A gente procura trazer investidores que entendam o momento e se sintam confortáveis com ele. O grande paradoxo do gestor é equacionar o funding para aproveitar as boas oportunidades que aparecem”, ressalta Abbud.
O PVBI fez seu IPO em julho de 2020, no auge da incerteza em relação aos escritórios, justamente para aproveitar o cenário volátil. Segundo Abbud, os investidores assimilaram a ideia, tanto que o fundo levantou quase R$ 1 bilhão e adquiriu o Union Faria Lima e a Torre B do Complexo JK, esta última em julho do ano passado.
A leitura é que 2022 não será um ano fácil para captar. “A gente está acompanhando a movimentação do mercado, vendo quais alternativas tem. Certamente vão surgir boas oportunidades e o grande desafio vai ser a estrutura de funding. Eu adoraria aproveitá-las, mas não faremos loucura”, completa o executivo.
Compromisso com a sustentabilidade
A Noah aplica em seus projetos um método de construção chamado Wood Building Design, que utiliza madeira engenheirada - cross laminated timber e glulam - como estrutura base. O material permite que boa parte da obra ocorra em ambiente de fábrica, reduzindo a quantidade de resíduos gerados e aumentando o controle de qualidade, segundo Theodorakis.
Neste caso, a sustentabilidade é uma vantagem competitiva não apenas por cumprir com os critérios ESG, cada vez mais exigidos pelos clientes, como também pela maior velocidade de entrega da obra. “O hiato de novos produtos deve gerar uma falta de espaços corporativos dentro de um ou dois anos, e com essa tecnologia conseguimos construir em quase metade do tempo”, diz o CEO da Noah.
A madeira também endossa a biofilia, característica típica dos novos projetos imobiliários. Theodorakis menciona que estudos internacionais mostram os impactos positivos de ambientes construídos em madeira sobre seus usuários: da maior produtividade nos escritórios até um melhor desempenho escolar das crianças, passando pela recuperação mais rápida de pacientes após cirurgias leves.
Ser ESG também é uma marca da VBI e da RBR. O PVBI, inclusive, é o primeiro fundo do Brasil com certificação que comprova suas características ambientais, sociais e de governança corporativa, concedido pela Sitawi com base nas regras da Sustainable Finance Disclosure Regulation da União Europeia, que entrou em vigor em março de 2021.
Segundo a política ESG do VBI Prime Properties, pelo menos 75% dos empreendimentos do fundo precisam ter certificação LEED Gold ou superior, além de uma série de outras regras neste sentido.
Por Henrique Cisman