Imagem de capaSylvain Fortier, chefe de Investimentos e Inovação da Ivanhoé Cambridge<br />Crédito: GRI Club/Flavio Guarnieri

Ivanhoé Cambridge mira residenciais para renda no Brasil

Sylvain Fortier, chefe de Investimentos, aponta esse ramo imobiliário como o mais atrativo no País no futuro próximo.

29 de novembro de 2019Mercado Imobiliário
Presente no Brasil desde 2006, com parcerias locais de peso com a Ancar, em shoppings, e a Prologis, no segmento industrial e logístico, a canadense Ivanhoé Cambridge está de olho em um novo ramo imobiliário no País, o de residenciais para renda. O ano de 2020 deve ser decisivo nesse sentido, para um estudo aprofundado de oportunidades ou mesmo para a concretização de investimentos.

Sylvain Fortier, chefe de Investimentos e Inovação da companhia, esteve em São Paulo em novembro para participar do 
Brazil GRI 2019 e conversou com a reportagem do GRI Hub com exclusividade. Nesta entrevista, ele fala sobre esses planos, compartilha sua visão sobre o setor imobiliário brasileiro no futuro próximo, revela maior conforto em realizar aportes de capital aqui na comparação com outras economias emergentes e não foge de um assunto polêmico: o caso da WeWork, que recentemente desistiu da abertura de capital num episódio cercado de reviravoltas. A Ivanhoé Cambridge havia acabado de estabelecer uma parceria com o grupo e, neste momento, opta por uma postura cautelosa até que os rumos da gigante do coworking estejam mais claros.

A Ivanhoé Cambridge é uma subsidiária da Caisse de Dépôt et Placement du Québec (CDPQ) focada em investimentos imobiliários e tem ativos globais nos segmentos industrial e logístico, de escritórios, residencial e de varejo. No final de 2018 (dados oficiais mais recentes disponíveis), o portfólio somava cerca de 65 bilhões de dólares canadenses (mais de R$ 200 bilhões).

Confira a entrevista de Sylvain Fortier:

Qual a sua visão para o Brasil em 2020, considerando as macrorreformas em andamento? E o que espera para o setor imobiliário, em particular?
Do ponto de vista do setor imobiliário e considerando as taxas de juros, os cap rates e uma perspectiva de investidor estrangeiro, parece já haver muita atenção para com o Brasil e um contexto muito positivo. Para nós, um dos principais riscos sempre é o câmbio. Esperamos que, quaisquer que sejam as reformas e independentemente de como sejam realizadas, haja um pouco mais de estabilidade na moeda. Isso seria ótimo. De todo modo, estamos muito otimistas. Entendo que o crescimento do País ainda não está tão elevado quanto gostaríamos, mas, apesar disso, todo o resto parece estar caminhando numa direção muito boa e correta.

A Ivanhoé Cambridge investe no Brasil desde 2006. Que comparativo você faz do ambiente e da estratégia de investimentos no País naquele momento e agora?
Começamos com a ideia de abrir outro braço no negócio varejista. Éramos essencialmente um proprietário operador e queríamos replicar o que tínhamos feito no Canadá. Hoje, nos tornamos muito mais um investidor imobiliário global, estabelecendo parcerias – como a concretizada com a
Ancar no Brasil – e reproduzindo essa estratégia em outros lugares e classes de ativos. Essa é a maior diferença e reflete o que estamos fazendo agora com a Prologis em logística [por meio de uma joint venture criada em janeiro de 2019, com valor estimado em US$ 880 milhões] e o que podemos vir a realizar, seja em residencial para renda ou produtos de uso misto. No presente estágio do ciclo, é provavelmente melhor ser um pouco mais cauteloso e não colocar todos os ovos na mesma cesta e dizer 'só quero fazer isso' num país do tamanho do Brasil. Então, creio que o caminho seja a diversificação por meio de diferentes parcerias, classes de ativos e perfis de riscos.
Olho 1


Na comparação com outros países, sobretudo economias emergentes, como posiciona o Brasil hoje?
O Brasil é um dos primeiros países para os quais fomos e nos quais permanecemos. Há outros países para os quais nos dirigimos e depois saímos. A Rússia, por exemplo, não funcionou bem na época. No bloco dos Brics, Índia e China também foram difíceis para nós. O Brasil foi o único em que ficamos para o longo prazo, não sei se por estar nas Américas e por nos sentirmos mais próximos. A cultura e talvez a política em países como Índia e China, para citar dois daqueles com que nos envolvemos bastante, é mais distante daquilo com que estamos acostumados. Há também questões de câmbio e estrutura fiscal que precisamos focar. Além disso, creio que o fato de estarmos no Brasil há mais tempo nos deixa mais confortáveis para começar algo localmente – até por não termos escolha a não ser acompanhar o que está acontecendo num país em que já temos investimentos versus outros em que não estamos presentes ou nos quais já estivemos, passamos por más experiências e decidimos sair. Há provavelmente um nível de conforto adicional para nós quando se trata do Brasil.

Se tivesse de eleger o segmento imobiliário mais atrativo para investimentos no Brasil mirando 2020, qual seria?
Logística não contaria porque já estamos fazendo, então eu apontaria
residencial para renda, algo que nos vejo começar a realizar. Isso, de certo modo, poderia ser ligado a questões como novos bairros e projetos de uso misto. As pessoas, globalmente, precisam de um lugar para morar. Isso se repete em todo lugar, ainda que a noção de poder alugar um apartamento em vez de ter a propriedade – diante de incertezas e por saber que o valor [do imóvel] muitas vezes sobe ou desce – não seja aceita da mesma maneira em todas as geografias. Em certos casos, pode haver a percepção de que se loca apenas quando não se pode comprar, mas, em muitos países desenvolvidos, em grandes cidades, pessoas alugam por opção. Então, numa cidade do tamanho de São Paulo, há, definitivamente, demanda para locar ótimos apartamentos sem o risco de flutuação do valor. Isso é algo que gostaríamos de fazer logo. Ainda não é possível afirmar se vai acontecer realmente em 2020; porém, tenho certeza de que vamos olhar para esse negócio muito em breve e será uma questão de tempo até efetivarmos a transação.

Essa estratégia envolverá um parceiro?
Sim. Sentimos que é positivo nos associar a alguém, de um ponto de vista de operação. Esse é o modelo que adotamos em todo lugar. Temos parcerias globais e locais – e a Ancar é um bom exemplo de parceria local. Também investimos por meio de fundos, o que não requer o mesmo envolvimento, mas às vezes é o modo de começar a investir em algo aos poucos. Então, veremos. Creio que um evento como este, o Brazil GRI, nos dá a oportunidade de conhecer pessoas, passar a mensagem do que queremos fazer e talvez novidades venham a surgir a partir desses dois dias de programação e interação.

Em maio, vocês anunciaram uma parceria estratégica com a The We Company, detentora da 
WeWork, para adquirir e desenvolver propriedades globalmente. Como isso tem evoluído? As dificuldades por que esse grupo vem passando, após a frustração do plano de abertura de capital, impactaram os planos?
O que queríamos fazer era investir em imóveis com eles. Então, eles criaram um braço separado e a ideia é comprar prédios de escritórios e trazer a WeWork como locatária para os espaços vagos, criando valor dessa maneira. O que aconteceu recentemente é muito relacionado à iniciativa do IPO [oferta pública inicial] e ao fato de que o valor estabelecido pelos bancos de investimento, de US$ 20 bilhões a US$ 25 bilhões no começo de setembro, teria sido equivalente a aproximadamente 50% do que o SoftBank [principal investidor do grupo] imaginava. O valor [antes previsto, de quase US$ 50 bilhões,] havia sido definido considerando a WeWork uma companhia de tecnologia, com múltiplos diferentes, formas diferentes de calcular o fluxo de caixa futuro. Acho que, basicamente, houve um desacordo entre dois acionistas, levando à decisão de não fazer o IPO e cortar algumas linhas de negócios para o crescimento futuro. O significado para nós é que, neste momento, continuamos a ter discussões sobre o pipeline e conversas sobre diferentes prédios, mas desejamos esperar pela nova WeWork, sua nova gestão, seu novo conselho e a nova estratégia que virá, pois isso tem impacto sobre como negociamos com um vendedor ou um financiador – e eles têm a mesma opinião, de esperar para ver. Acredito que, no final, nos principais mercados, nada vai mudar; contudo, nos mais novos, em que eles ainda não estavam presentes, provavelmente a estratégia de crescimento bastante agressivo que vinha sendo adotada seja interrompida.
Olho 2


Recentemente, a
Blackstone deu um passo atrás na sua estratégia para o Brasil por conta da dificuldade de encontrar transações no País com tíquete compatível com seus fundos globais cada vez maiores. Essa questão de investimentos com valor suficientemente alto para serem atrativos também é um ponto crítico para vocês e outros investidores internacionais que observa?
Não é para nós. Entendo que a Blackstone tem muita capacidade, então gosta de focar em transações muito grandes. No nosso caso, não temos um valor mínimo ou máximo, mas não é desejável que seja muito pequeno, para justificar o tempo despendido. 

Entrevista concedida à editora-chefe, Giovanna Carnio