Ofertas públicas de Fiagros imobiliários já superam R$ 5,5 bilhões
Emissões caíram nos últimos meses, mas mercado tem tudo para crescer
6 de maio de 2022Mercado Imobiliário
Criados pela Lei Federal 14.130/2021 e regulamentados de forma temporária e em caráter experimental pela Resolução 39, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), os Fundos de Investimento em Cadeias Agroindustriais (Fiagros) já movimentaram quase R$ 6 bilhões em ofertas públicas via instrução 400, a partir de agosto do ano passado. Desse montante, R$ 5,5 bilhões são de Fiagros imobiliários.
Um deles é o Vectis DATAGRO Crédito Agronegócio (VCRA11), da Vectis Gestão. O sócio da gestora, Mucio Mattos, afirma que a similaridade das regras tributárias dos Fiagros-FII em relação aos fundos imobiliários é um dos principais motivos para essa categoria predominar, além do fato de ser a única aberta a investidores de varejo.
Na regulamentação temporária, a CVM dispõe que os Fiagros podem ser criados em três categorias: imobiliário (Fiagro-FII), investimento em participações (Fiagro-FIP) e direitos creditórios (Fiagro-FIDC). Nos dois últimos, a oferta é disponível apenas a investidores qualificados, com aportes de R$ 1 milhão, no mínimo.
O único Fiagro-FIDC emitido via instrução 400 até o momento é o BTG Pactual Crédito Agrícola (BTAG11), que captou R$ 311 milhões. De acordo com o sócio e gestor do portfólio agro do banco, Leonardo Zambolin, os recursos já foram investidos no setor e há demanda para uma nova captação, mas isso vai depender do apetite do mercado - em um momento que não é dos mais favoráveis.
“Há uma guerra na Ucrânia, lockdowns na China, inflação global e as eleições locais. O cenário é bem desafiador, fora a estrutura de captação que, de modo geral, é custosa, e a performance em bolsa, que não necessariamente oferece o melhor risco-retorno no momento”, avalia o executivo.
Se houver uma boa janela, o BTG Pactual entende que há demanda para fazer desembolsos de R$ 600 MM a R$ 800 MM por ano no agro. “Não é à toa que há tantas gestoras criando produtos. Tem muito espaço para o capital privado e é legal ver esse mercado se profissionalizar”, completa.
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Além do BTAG11, o BTG tem dois FIIs com ativos da cadeia agroindustrial, ambos abertos antes da Resolução 39 da CVM: o BTAL11 investe em logística, como na armazenagem de insumos e produtos, enquanto o BTRA11 é voltado à aquisição de terras agrícolas. Juntos, os fundos têm cerca de R$ 1 bilhão em patrimônio. “No futuro, pode ser uma opção transformá-los em Fiagros imobiliários. Talvez, faça mais sentido”, diz Zambolin.
Assim como a maioria dos Fiagros-FII, a Vectis entrou neste mercado focada em crédito, via CRA e LCA, uma estratégia que é natural, até pelo melhor desempenho observado nos fundos de papel em relação aos fundos de tijolo no setor imobiliário.
Segundo Mattos, no longo prazo, o volume captado pelos Fiagros deve superar as emissões de FIIs, dados os tamanhos de cada setor: 27% contra 9% do PIB, respectivamente. Por outro lado, há desafios importantes, como a credibilidade e a educação do setor agro junto aos investidores, além do menor grau de sofisticação das empresas do agronegócio.
Por essa razão, a gestora optou por criar seu primeiro Fiagro em parceria com uma consultoria especializada. “As questões de governança e transparência de informações exigem uma diligência muito mais complexa e robusta para os investimentos. A DATAGRO tem capital humano e inteligência setorial que nunca conseguiríamos incorporar na Vectis; teríamos que montar uma gestora do zero só para focar no agronegócio”, ressalta o executivo.
O lado bom é que se trata de um setor contracíclico, capaz de crescer mesmo em momentos de crise, como o atual: “É um investimento muito interessante, até como diversificação da carteira. Minha expectativa é que o Fiagro cresça de forma mais constante e menos volátil do que os fundos imobiliários. Acho que é um bom começo, apesar da subida dos juros e de algumas expectativas do mercado que estavam maiores”, completa Mattos.
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O sócio do Cescon, Barrieu, Flesch & Barreto Advogados, Eduardo Herszkowicz, explica que cada fundo estruturado - FII, FIP, FIDC e Fiagro - será regulamentado como um anexo da regra geral, que está sendo atualizada (hoje, é disposta na instrução 555). “Está na agenda regulatória da CVM, em 2022, abrir audiência pública sobre a regulamentação específica do Fiagro”, afirma.
“Não dá para saber como ficará essa especificação, se as categorias serão mantidas. É um ponto interessante para se discutir. De toda forma, o prazo de um ano geralmente é suficiente para coletar informações, e a CVM tem sido bem proativa, então podemos esperar que essa regulamentação definitiva [do Fiagro] saia no ano que vem”, completa Herszkowicz.
O caráter experimental e temporário da Resolução 39 é elogiado pelos dois especialistas. “A CVM optou por analisar como o mercado reage ao produto, quais são as dúvidas e características do agronegócio. É um setor que ela ainda não conhece, então é uma atitude correta, na minha opinião, porque corria o risco de traumatizar um mercado que tem potencial gigantesco, mas precisa de histórico”, avalia Packer.
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Com muitas semelhanças tributárias em relação aos FIIs, como isenção à pessoa física na distribuição de dividendos, o Fiagro tem a vantagem de permitir ao agricultor/proprietário conferir sua terra ao fundo pelo valor de mercado sem pagar pelo ganho de capital nessa transferência. “Ele pode transferir a fazenda em troca de cotas e depois vendê-las sem apurar ganho de capital”, explica Herszkowicz.
Além de financiar pequenos e médios produtores rurais, preenchendo um filão deixado pelos grandes bancos, os Fiagros terão como resultado natural a regularização fundiária: “Para comprar um imóvel rural, o fundo precisa ter certeza sobre as informações daquilo que está comprando, das medições, das características da terra. Ao comprar e vender, o Fiagro exerce esse papel”, acrescenta Packer.
“A demanda do agronegócio sempre existiu. O que ocorre é que nunca se conectou o investidor ao pequeno produtor. A partir da criação da figura do Fiagro, viabilizam-se esses investimentos sem que haja uma expansão dos latifúndios, como costumava acontecer. É esse o ponto interessante: impedir o latifúndio e o êxodo rural”, finaliza o estruturador do Credit Suisse.
O Fiagro foi viabilizado pelo governo federal a partir da modificação da Lei Federal 8.668/93, que dispõe sobre os fundos de investimento imobiliário (FII).
Por Henrique Cisman
Um deles é o Vectis DATAGRO Crédito Agronegócio (VCRA11), da Vectis Gestão. O sócio da gestora, Mucio Mattos, afirma que a similaridade das regras tributárias dos Fiagros-FII em relação aos fundos imobiliários é um dos principais motivos para essa categoria predominar, além do fato de ser a única aberta a investidores de varejo.
Na regulamentação temporária, a CVM dispõe que os Fiagros podem ser criados em três categorias: imobiliário (Fiagro-FII), investimento em participações (Fiagro-FIP) e direitos creditórios (Fiagro-FIDC). Nos dois últimos, a oferta é disponível apenas a investidores qualificados, com aportes de R$ 1 milhão, no mínimo.
O único Fiagro-FIDC emitido via instrução 400 até o momento é o BTG Pactual Crédito Agrícola (BTAG11), que captou R$ 311 milhões. De acordo com o sócio e gestor do portfólio agro do banco, Leonardo Zambolin, os recursos já foram investidos no setor e há demanda para uma nova captação, mas isso vai depender do apetite do mercado - em um momento que não é dos mais favoráveis.
“Há uma guerra na Ucrânia, lockdowns na China, inflação global e as eleições locais. O cenário é bem desafiador, fora a estrutura de captação que, de modo geral, é custosa, e a performance em bolsa, que não necessariamente oferece o melhor risco-retorno no momento”, avalia o executivo.
Se houver uma boa janela, o BTG Pactual entende que há demanda para fazer desembolsos de R$ 600 MM a R$ 800 MM por ano no agro. “Não é à toa que há tantas gestoras criando produtos. Tem muito espaço para o capital privado e é legal ver esse mercado se profissionalizar”, completa.
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Além do BTAG11, o BTG tem dois FIIs com ativos da cadeia agroindustrial, ambos abertos antes da Resolução 39 da CVM: o BTAL11 investe em logística, como na armazenagem de insumos e produtos, enquanto o BTRA11 é voltado à aquisição de terras agrícolas. Juntos, os fundos têm cerca de R$ 1 bilhão em patrimônio. “No futuro, pode ser uma opção transformá-los em Fiagros imobiliários. Talvez, faça mais sentido”, diz Zambolin.
Assim como a maioria dos Fiagros-FII, a Vectis entrou neste mercado focada em crédito, via CRA e LCA, uma estratégia que é natural, até pelo melhor desempenho observado nos fundos de papel em relação aos fundos de tijolo no setor imobiliário.
Segundo Mattos, no longo prazo, o volume captado pelos Fiagros deve superar as emissões de FIIs, dados os tamanhos de cada setor: 27% contra 9% do PIB, respectivamente. Por outro lado, há desafios importantes, como a credibilidade e a educação do setor agro junto aos investidores, além do menor grau de sofisticação das empresas do agronegócio.
Por essa razão, a gestora optou por criar seu primeiro Fiagro em parceria com uma consultoria especializada. “As questões de governança e transparência de informações exigem uma diligência muito mais complexa e robusta para os investimentos. A DATAGRO tem capital humano e inteligência setorial que nunca conseguiríamos incorporar na Vectis; teríamos que montar uma gestora do zero só para focar no agronegócio”, ressalta o executivo.
O lado bom é que se trata de um setor contracíclico, capaz de crescer mesmo em momentos de crise, como o atual: “É um investimento muito interessante, até como diversificação da carteira. Minha expectativa é que o Fiagro cresça de forma mais constante e menos volátil do que os fundos imobiliários. Acho que é um bom começo, apesar da subida dos juros e de algumas expectativas do mercado que estavam maiores”, completa Mattos.
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Próximos passos na regulamentação dos Fiagros
Rafael Packer, estruturador sênior do Credit Suisse, participou de perto das discussões do projeto de lei na Câmara e no Senado, bem como atuou junto à Anbima e à CVM na Resolução 39. O executivo diz que o novo código de fundos - atualmente sendo desenhado pela CVM - terá um capítulo específico sobre os Fiagros, com previsão para o segundo semestre de 2023.O sócio do Cescon, Barrieu, Flesch & Barreto Advogados, Eduardo Herszkowicz, explica que cada fundo estruturado - FII, FIP, FIDC e Fiagro - será regulamentado como um anexo da regra geral, que está sendo atualizada (hoje, é disposta na instrução 555). “Está na agenda regulatória da CVM, em 2022, abrir audiência pública sobre a regulamentação específica do Fiagro”, afirma.
“Não dá para saber como ficará essa especificação, se as categorias serão mantidas. É um ponto interessante para se discutir. De toda forma, o prazo de um ano geralmente é suficiente para coletar informações, e a CVM tem sido bem proativa, então podemos esperar que essa regulamentação definitiva [do Fiagro] saia no ano que vem”, completa Herszkowicz.
O caráter experimental e temporário da Resolução 39 é elogiado pelos dois especialistas. “A CVM optou por analisar como o mercado reage ao produto, quais são as dúvidas e características do agronegócio. É um setor que ela ainda não conhece, então é uma atitude correta, na minha opinião, porque corria o risco de traumatizar um mercado que tem potencial gigantesco, mas precisa de histórico”, avalia Packer.
Veja o calendário completo de eventos presenciais do GRI Club Real Estate Brazil
Com muitas semelhanças tributárias em relação aos FIIs, como isenção à pessoa física na distribuição de dividendos, o Fiagro tem a vantagem de permitir ao agricultor/proprietário conferir sua terra ao fundo pelo valor de mercado sem pagar pelo ganho de capital nessa transferência. “Ele pode transferir a fazenda em troca de cotas e depois vendê-las sem apurar ganho de capital”, explica Herszkowicz.
Além de financiar pequenos e médios produtores rurais, preenchendo um filão deixado pelos grandes bancos, os Fiagros terão como resultado natural a regularização fundiária: “Para comprar um imóvel rural, o fundo precisa ter certeza sobre as informações daquilo que está comprando, das medições, das características da terra. Ao comprar e vender, o Fiagro exerce esse papel”, acrescenta Packer.
“A demanda do agronegócio sempre existiu. O que ocorre é que nunca se conectou o investidor ao pequeno produtor. A partir da criação da figura do Fiagro, viabilizam-se esses investimentos sem que haja uma expansão dos latifúndios, como costumava acontecer. É esse o ponto interessante: impedir o latifúndio e o êxodo rural”, finaliza o estruturador do Credit Suisse.
O Fiagro foi viabilizado pelo governo federal a partir da modificação da Lei Federal 8.668/93, que dispõe sobre os fundos de investimento imobiliário (FII).
Por Henrique Cisman