Desafios para a universalização do saneamento no Brasil

Apesar de o novo marco legal impulsionar o acesso universal aos serviços, ainda existem obstáculos a serem superados

5 de dezembro de 2023Infraestrutura
Por Henrique Cisman

Membros do GRI Club Infra se reuniram para dois dias de diálogo entre si e com autoridades públicas a fim de debater o panorama da infraestrutura e energia no Brasil, visando destravar o grande potencial de investimentos no setor.

O encontro foi realizado em São Paulo e trouxe uma agenda robusta contemplando diversos subsegmentos, como transportes, mobilidade urbana, saneamento básico, energia e infraestrutura social. 

Confira a seguir os principais insights relacionados à estruturação de projetos em saneamento básico.
 

Sessão reuniu importantes players privados que operam no setor (imagem: João de Faria/GRI Club)

Longo caminho a percorrer

Aprovado em 2020, o  Novo Marco Legal do saneamento básico determina a universalização dos serviços até 2033, com 99% da população atendida pela oferta de água tratada e 90% pela coleta e tratamento do esgoto. 

Nos últimos três anos, as novas regras já surtiram algum efeito no país, destravando grandes investimentos em Estados e Municípios, a exemplo da concessão dos blocos da CEDAE, no Rio de Janeiro, e de treze municípios em Alagoas, dentre outros, além de incentivar a regionalização para tornar os projetos mais atrativos e fomentar a privatização de estatais visando o cumprimento das metas. 

Um dos grandes desafios, porém, consiste na regulamentação de diretrizes trazidas pelo novo marco legal, papel que cabe à Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), cujos representantes participaram ativamente do debate, destacando a importância do alinhamento com os titulares dos serviços nesta agenda regulatória. 

O órgão afirma que é preciso conscientizar o investidor sobre as diferenças entre regulação discricionária e contratual. O Brasil adota um modelo híbrido, dependendo das características da concessão, mas o novo marco legal pende para o modelo de contratos. Segundo especialistas, essa calibração vai depender das normas de referência criadas pela ANA e da adesão pelos entes subnacionais. 

Executivos presentes opinam que a regulação contratual é mais simples, ao passo que a discrionária demanda uma escala de projetos - o que não representa o panorama atual do saneamento no Brasil. "Faltam projetos", diz um investidor. Ressalta-se que a parte regulatória corresponde, em média, a 15% do risco do investimento em projetos do setor. 

Discussão possibilitou a interação de todos os presentes (imagem: João de Faria/GRI Club)

No rol dos desafios, também é mencionado o alto volume de recursos a serem aportados visando o alcance das metas dentro do prazo estabelecido e, por isso, a necessidade de atrair fundos de pensão e capital estrangeiro para os projetos de saneamento. Neste sentido, além da questão regulatória, os obstáculos são a falta de conhecimento local e os longos prazos de aprovações e licenciamentos.

Outro ponto debatido é a utilização da outorga: alguns participantes defendem o uso dos recursos obtidos para viabilizar projetos mais complexos. Sugere-se, por exemplo, que o titular possa abrir mão de um percentual recebido - em torno de 10% - para subsidiar a tarifa social, um dos pontos que requerem melhoria, segundo investidores. 

Em relação à regionalização de municípios para torná-los mais atrativos ao investidor privado, são apontadas duas dificuldades principais: 1) os prefeitos têm mais autonomia quando o serviço é individualizado; 2) municípios mais próximos da universalização tendem a não querer aderir. Sobre esta última, um possível caminho é cobrar tarifas mais baixas em relação aos demais. 

Por fim, os executivos do setor não demonstram otimismo com o novo Programa de Aceleração do Crescimento, entendendo que se trata mais de propaganda e jogo político do que de um plano efetivo para a universalização dos serviços com qualidade. 

Dentre os argumentos, estão a falta de clareza nos critérios para a escolha dos projetos contemplados e o orçamento aquém do necessário: R$ 8,5 bilhões por ano até 2026, o que corresponde a cerca de 20% do total necessário estimado pelo Instituto Trata Brasil.

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