Entenda como será a próxima crise do mercado imobiliário internacional
Brasil está em situação diferente, mas vale o alerta
16 de março de 2023Mercado Imobiliário
Muitos especialistas já comparam a crise mundial que toma corpo na atualidade com a de 2008. Há exatos 15 anos, o mercado imobiliário residencial via sua bolha estourar e o resto já virou até filme ("A Grande Aposta", 2015).
De minha parte, entendo que o cenário que está se desenhando guarda grande correlação com a forma como lidamos com a quebra de 2008, mas possui algumas peculiaridades interessantes. Vamos a elas.
Os desafios para controlar a inflação fazem com que seja difícil imaginarmos uma queda rápida dos juros dos bancos centrais Americano e Europeu. O BCE, inclusive, acaba de elevar novamente a taxa básica da Europa em 50 pontos-base, para 3,5%. Assim, desenha-se uma situação de pressão por liquidez não apenas sobre os bancos menores, mas também com relação aos maiores.
Se há 15 anos o mercado residencial foi a grande bomba que impactou o sistema, dessa vez, acredito que os desafios podem estar relacionados aos prédios de escritórios corporativos.
Com a deterioração do ambiente econômico, os proprietários de grandes carteiras de prédios de escritórios nos EUA e na Europa vão encontrar mais desafios para manter o pagamento de suas obrigações em dia. Não bastasse os juros altos impactando em suas dívidas, some-se a isso o fato de que hoje, em muitas cidades americanas e europeias, a ocupação dos prédios de escritórios não chega a 50%. Assim, fica fácil concluir e até uma criança de 10 anos consegue entender: se sua dívida aumenta e a entrada de receita com inquilinos encolhe, o resultado pode ser devastador num ambiente em que a alavancagem sempre foi utilizada com muita habilidade para obtenção do melhor resultado nas operações.
Por isso, se tivesse que apostar em um desfecho eu diria que, como já vimos no passado, muitos fundos vão simplesmente devolver os prédios para os bancos e em outros casos ocorrerão consolidações significativas de portfólios. Será a nova era dos famosos distressed assets, parte do ciclo imobiliário mundial que já vimos em diversos países no passado.
É fato que os bancos hoje estão muito mais preparados do que em 2008. Outra diferença importante é que, se há 15 anos os donos das casas eram os que deviam e estavam pressionados pelos bancos, hoje a imensa maioria dos proprietários dos prédio comerciais são os fundos, com bolsos muito mais robustos que os indivíduos que não mais conseguiram pagar seu mortgage em 2008 e devolveram suas casas para os bancos. E mais: muito do dinheiro dentro desses fundos vêm de fundos de pensões que podem se ver forçados a aportar ainda mais dinheiro para não perderem seus investimentos.
Ainda em janeiro, em conversas de bastidores na Suíça, ouvi de fontes diretas que os bancos estavam sendo "pacientes e compreensíveis" nas cobranças de suas dívidas. Mas num cenário de aumento ainda maior de juros sinalizado pelo FED, bem como de nervosismo quanto ao crédito em todo o mundo, o tom adotado pelos grandes bancos pode mudar e trazer dificuldades para os players do mercado imobiliário. Se isso ocorrer, teremos um ambiente de dificuldades com repercussões consideráveis.
Se sairmos dos mercados americano e europeu descritos e aterrissarmos no Brasil, encontramos uma situação que considero bem diferente. Entendo que os juros como estão e mesmo caindo para 12% até o fim do ano ainda irão continuar colocando pressão em cima de alguns donos de prédios que podem buscar liquidez. Isso deve trazer certa movimentação transacional para o mercado. Ao mesmo tempo, no Brasil voltou-se ao escritório antes dos EUA e da Europa. Por mais que o híbrido tenha se tornado um novo normal para boa parte das empresas, pesquisas mostram que o volume de metro quadrado locado não caiu como se imaginava. Isso porque a ida ao escritório passou a ser um momento de criação coletiva, construção de cultura e relacionamento. Para isso, precisa-se de um espaço adequado (e não de espaços mais apertados).
Seja no Brasil ou em mercados mais maduros, essa crise irá sacramentar que prédios de escritório B e C terão que buscar nova destinação. Seja residencial multifamily, hotel, micro data center ou o que for, o fato é que aqueles proprietários que se segurarem a esse tipo de imóvel irão morrer abraçados com os mesmos.
E o mundo? Como fica com toda essa turbulência? Prometo voltar nesse ponto em outro momento. Por agora, recomendo a leitura do livro de Ray Dalio: "Principles for Dealing with the Changing World Order".
Muito está por vir, num 2023 que parece que só começou…
Gustavo Favaron
CEO & Managing Partner GRI Club e 8 Capital Group
De minha parte, entendo que o cenário que está se desenhando guarda grande correlação com a forma como lidamos com a quebra de 2008, mas possui algumas peculiaridades interessantes. Vamos a elas.
Os desafios para controlar a inflação fazem com que seja difícil imaginarmos uma queda rápida dos juros dos bancos centrais Americano e Europeu. O BCE, inclusive, acaba de elevar novamente a taxa básica da Europa em 50 pontos-base, para 3,5%. Assim, desenha-se uma situação de pressão por liquidez não apenas sobre os bancos menores, mas também com relação aos maiores.
Se há 15 anos o mercado residencial foi a grande bomba que impactou o sistema, dessa vez, acredito que os desafios podem estar relacionados aos prédios de escritórios corporativos.
Com a deterioração do ambiente econômico, os proprietários de grandes carteiras de prédios de escritórios nos EUA e na Europa vão encontrar mais desafios para manter o pagamento de suas obrigações em dia. Não bastasse os juros altos impactando em suas dívidas, some-se a isso o fato de que hoje, em muitas cidades americanas e europeias, a ocupação dos prédios de escritórios não chega a 50%. Assim, fica fácil concluir e até uma criança de 10 anos consegue entender: se sua dívida aumenta e a entrada de receita com inquilinos encolhe, o resultado pode ser devastador num ambiente em que a alavancagem sempre foi utilizada com muita habilidade para obtenção do melhor resultado nas operações.
Por isso, se tivesse que apostar em um desfecho eu diria que, como já vimos no passado, muitos fundos vão simplesmente devolver os prédios para os bancos e em outros casos ocorrerão consolidações significativas de portfólios. Será a nova era dos famosos distressed assets, parte do ciclo imobiliário mundial que já vimos em diversos países no passado.
É fato que os bancos hoje estão muito mais preparados do que em 2008. Outra diferença importante é que, se há 15 anos os donos das casas eram os que deviam e estavam pressionados pelos bancos, hoje a imensa maioria dos proprietários dos prédio comerciais são os fundos, com bolsos muito mais robustos que os indivíduos que não mais conseguiram pagar seu mortgage em 2008 e devolveram suas casas para os bancos. E mais: muito do dinheiro dentro desses fundos vêm de fundos de pensões que podem se ver forçados a aportar ainda mais dinheiro para não perderem seus investimentos.
Ainda em janeiro, em conversas de bastidores na Suíça, ouvi de fontes diretas que os bancos estavam sendo "pacientes e compreensíveis" nas cobranças de suas dívidas. Mas num cenário de aumento ainda maior de juros sinalizado pelo FED, bem como de nervosismo quanto ao crédito em todo o mundo, o tom adotado pelos grandes bancos pode mudar e trazer dificuldades para os players do mercado imobiliário. Se isso ocorrer, teremos um ambiente de dificuldades com repercussões consideráveis.
Se sairmos dos mercados americano e europeu descritos e aterrissarmos no Brasil, encontramos uma situação que considero bem diferente. Entendo que os juros como estão e mesmo caindo para 12% até o fim do ano ainda irão continuar colocando pressão em cima de alguns donos de prédios que podem buscar liquidez. Isso deve trazer certa movimentação transacional para o mercado. Ao mesmo tempo, no Brasil voltou-se ao escritório antes dos EUA e da Europa. Por mais que o híbrido tenha se tornado um novo normal para boa parte das empresas, pesquisas mostram que o volume de metro quadrado locado não caiu como se imaginava. Isso porque a ida ao escritório passou a ser um momento de criação coletiva, construção de cultura e relacionamento. Para isso, precisa-se de um espaço adequado (e não de espaços mais apertados).
Seja no Brasil ou em mercados mais maduros, essa crise irá sacramentar que prédios de escritório B e C terão que buscar nova destinação. Seja residencial multifamily, hotel, micro data center ou o que for, o fato é que aqueles proprietários que se segurarem a esse tipo de imóvel irão morrer abraçados com os mesmos.
E o mundo? Como fica com toda essa turbulência? Prometo voltar nesse ponto em outro momento. Por agora, recomendo a leitura do livro de Ray Dalio: "Principles for Dealing with the Changing World Order".
Muito está por vir, num 2023 que parece que só começou…
Gustavo Favaron
CEO & Managing Partner GRI Club e 8 Capital Group